Fez bem a ministra Cármen Lúcia ao mandar os tribunais de todo o país abrirem suas caixas-pretas salariais. Ao dar um prazo de 10 dias, ela mostrou que sua decisão é para valer. Se conseguir, será uma proeza inédita. Feito que, por si só, pode carimbar sua gestão como revolucionária.
Além da farra salarial, com vencimentos engordados com os mais variados e absurdos penduricalhos, essa turma costuma achar que não deve satisfação a ninguém.
Há mais de 10 anos, Nelson Jobim também presidia o STF e o Conselho Nacional de Justiça. Resolveu comprar essa briga. Durante seis meses, cobrou informações dos tribunais estaduais. Insistiu, ameaçou. Mesmo assim, os magistrados de vários estados se recusaram a responder, outros mandaram respostas incompletas.
Em parceria com o repórter Ronald Freitas, fui atrás dos que, então, se lixaram para as cobranças do Conselho Nacional de Justiça. Alguns nem quiseram conversa. Outros tentaram se justificar. Diziam que estavam amparados em leis estaduais, imunes a bedelhos federais.
Teve até quem acusasse Jobim de armar um circo para se credenciar a concorrer como candidato a vice de Lula na eleição presidencial de 2006.
Ainda assim, foi possível mostrar que, na Justiça, o teto salarial era uma ficção. O plenário do STF resolveu pôr ordem na casa. Decidiu que juiz algum, estadual ou federal, poderia receber vencimentos acima do teto salarial. Aí, o CNJ abriu uma janelinha aqui, o STF outra ali…
Pois bem. Tantos anos depois, continua tudo igual. Em alguns casos, como se viu recentemente em Mato Grosso, até pior.
Onze anos atrás, nossa reportagem na revista Época, começava assim: “Poucos segredos são tão bem guardados na Justiça brasileira quanto os salários dos magistrados, em especial dos desembargadores estaduais”.
A nossa expectativa era de que, enfim, o CNJ abrisse essa caixa-preta. Jobim e nenhum dos seus sucessores conseguiu. Ou quis.
A dificuldade de Cármen Lúcia começa no próprio STF. Alguns penduricalhos são mantidos por causa de liminar de Luiz Fux. Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello defendem abertamente a farra de remunerações, o desrespeito ao teto, e até dizem, sem corar, que os juízes sofrem arrocho salarial.
“Se dribla o teto porque os vencimentos não fazem frente para o magistrado manter uma vida condigna”, disse Marco Aurélio, justificando uma ilegalidade em plena sessão do STF.
Faça história, Cármen Lúcia.
A conferir.