Neste 20 de setembro se iniciam no Rio Grande do Sul as comemorações da Semana Farroupilha, lembrando os 185 anos da eclosão da Guerra dos Farrapos, o movimento político-militar que sustentou uma guerra civil por 10 anos, entre 1935 e 1845. Foi o movimento armado mais longo da História do Brasil.
A Revolução Farroupilha, que instrumentou a Guerra dos Farrapos, foi a mais expressiva, pela duração e repercussão internacional, das chamadas revoltas regenciais, que se produziram por todo o Brasil na década de 1830. O levante do sul do Brasil estava diretamente interligado às revoluções autonomistas do Partido Liberal, de programa republicano, que teve episódios em Santa Catarina (República Juliana), a Sabinada (liderada pelo médico Francisco Sabino), na Bahia, a Revolução Liberal de Sorocaba (liderada pelo ex-regente padre Diogo Feijó), em São Paulo, e a revolta da Vila do Príncipe, em Minas Gerais, sob o comando do senador Teófilo Otoni.
No seu tempo, o movimento dos gaúchos apresentou-se como uma manifestação tardia do republicanismo americano fomentado pela maçonaria inglesa, que teve seu início na Guerra da Independência do Estados Unidos. A maçonaria financiou as guerras de libertação de Simon Bolívar, no norte da América do Sul, e de José de San Martin no Vice Reinado do Prata (atuais Argentina, Bolívia, Paraguai e Uruguai), no Chile e Peru. No sul do Brasil, o levante foi impulsionado pela maçonaria de Porto Alegre (RS) e de Pelotas (RS).
Na sua época, a guerra civil brasileira, embora tardia, constituiu-se no único movimento armado em curso no mundo contrário à restauração do absolutismo, posto de volta na Europa pelo Congresso de Viena, 20 anos antes. Atualmente a Revolução Farroupilha e seus líderes são desqualificados por alguns segmentos da intelectualidade gaúcha. Entretanto, no seu tempo, o movimento teve repercussão internacional, por ser a única revolução republicana em atividade, afrontando a restauração do “ancien régime” pela Santa Aliança (Prússia, Rússia e Áustria). É isto que explica porque a letra do hino da Republica canta que “sirvam nossas façanhas de modelo a toda terra”, um verso pouco compreendido nos dias atuais. O Rio Grande do Sul era uma espécie de Cuba dos anos 1960.
Como única guerra civil republicana em curso, os farroupilhas atraíram rebeldes jacobinos da Europa, América do Norte e latinos (algo como as brigadas internacionais da guerra civil espanhola), todos filiados à maçonaria, destacando-se o líder carbonário de primeira grandeza, o italiano Guiseppe Garibaldi, que foi profundamente impactado pelos republicanos brasileiros: herói da unificação italiana, comparecia ao Parlamento com trajes típicos de gaúchos (bombachas e pala). Sua mulher, Anita, era ativista republicana na cidade de Laguna, em Santa Catarina, onde os farrapos implantaram a efêmera República Juliana.
A Guerra dos Farrapos dividiu o Partido Liberal no Rio Grande do Sul. Em Porto Alegre, no primeiro círculo (margem esquerda do rio Jacuí), uma facção liderada pela família Marques de Souza (que deu o Conde de Porto Alegre e o Marquês de Tamandaré), rompeu com os farrapos e fez a guerra contra os republicanos. Por sua atuação contra a República Rio-Grandense, a capital gaúcha recebeu a legenda, que consta em seu escudo, de “Mui Leal e Valerosa Cidade de Porto Alegre”. Atualmente a capital gaúcha também comemora a Revolução Farroupilha.
A facção farroupilha tinha suas bases na metade sul do Estado, que tinha como cidade principal Pelotas, que era o maior centro industrial do Rio Grande do Sul naquele tempo.
O chefe político da revolução foi um coronel de milícias, Bento Gonçalves, que conseguiu unir numa frente ampla os três partidos antes antagonistas, os republicanos radicais, republicanos moderados e monarquistas moderados, façanha política semelhante somente foi repetida em 1930, com Getúlio Vargas, que formou uma frente única com chimangos e maragatos. Bento Gonçalves teve apoio dos líderes maçons do Partido Colorado, do Uruguai, e, até certo ponto, dos “federales”, da Argentina.
A pacificação se deu num acordo político, que os gaúchos chamam de Tratado de Ponche Verde, negociado pelo futuro duque de Caxias (ainda barão). Este militar e político (na época, deputado nacional pelo Maranhão) era adversário, no âmbito nacional, dos liberais gaúchos, integrados ao grupo saquarema, que lutavam contra os farrapos. No Rio Grande do Sul, ajudado pelo futuro general Osório, Caxias negociou o fim da guerra e foi indicado pelos ex-inimigos para o cargo de presidente da província (atualmente governador) e, um ano depois, apoiado pelos antigos rebeldes, foi eleito senador pelo Rio Grande do Sul, cargo que exerceu até seu falecimento em 1880. O duque de Caxias era maçom, eleito pelos republicanos gaúchos e tomou posse na bancada do Partido Conservador, em oposição a seu pai, senador Francisco de Lima e Silva, também general e senador pelo Partido Liberal do Rio de Janeiro.