O Ministério da Educação resistiu até a última hora para adiar o Enem, ignorando pedidos de (quase) todos os lados: parlamentares, secretários estaduais de Educação, reitores de universidades federais, professores, estudantes. O ministro Abraham Weintraub chegou a dizer que “o Enem não é feito para corrigir injustiça social, é para selecionar as melhores pessoas”.
Enquanto o ministro falava em esperar até agosto para tomar uma decisão, o Senado aprovou o adiamento. O placar evidenciou o ânimo dos senadores: 75 votos a 1, com o simbolismo de que o único voto contrário foi o do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ).
No dia seguinte, a Câmara dos Deputados já se preparava para aprovar a urgência do projeto de lei da senadora Daniella Ribeiro (PP-PB), quando o governo finalmente recuou. Avisado de que a equipe de Weintraub anunciara o adiamento, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), queria a confirmação do Palácio do Planalto. “Não posso acreditar nesse ministro”, disse Maia, enquanto presidia a sessão.
O Inep, órgão responsável pelo exame, anunciou que as provas antes marcadas para novembro serão adiadas por 30 a 60 dias. Logo, para dezembro ou janeiro. Divulgou também que fará uma enquete junto aos inscritos, no final de junho, antes de definir as novas datas.
Em meio à pandemia do novo coronavírus, os estudantes ganharão um ou dois meses a mais em sua preparação. O prazo é curto, mas favorece quem está com dificuldades ou impossibilitado de acompanhar o ensino remoto. Ainda mais se as escolas cumprirem seu papel e, na retomada das aulas presenciais, conseguirem recuperar parte do tempo perdido.
Ao contrário do que afirmou o ministro da Educação, o Enem tem papel no combate às desigualdades. Como lembra o ex-diretor do Inep Dilvo Ristoff, o exame só ganhou o atual formato para servir ao Sisu, sistema de acesso a universidades públicas que utiliza as notas do Enem − a exemplo do Prouni e do Fies. Sem isso, destacou Dilvo em artigo no blog Educa 2022, “o perfil dos estudantes no campus brasileiro continuaria insuportavelmente elitista e o desenho do Enem, por consequência, seria totalmente distinto”.
Com as escolas fechadas, o adiamento das provas ajuda o Enem a cumprir sua função.
* Demétrio Weber é jornalista, mestre em Direitos Humanos, Cidadania e Violência e criador do blog Educa 2022