O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2020 tem tudo para aumentar as já desmedidas desigualdades educacionais brasileiras. Com as escolas fechadas devido ao novo coronavírus, como fica quem não tem computador, internet nem local de estudo e ainda precisa correr atrás de trabalho para compensar a perda de renda da família?
Mantido o atual cronograma, milhões de estudantes farão as provas do Enem daqui a menos de seis meses. Em comum, poderão afirmar que suas escolas ficaram fechadas por causa da pandemia. Mas as semelhanças terminarão aí. Em termos de aprendizagem, terá crescido o abismo que deixa uma multidão de excluídos para trás.
As disparidades de acesso e qualidade no ensino remoto, apesar dos esforços da rede pública, têm motivado pedidos de adiamento do Enem. Assim já se posicionaram o Conselho Nacional de Educação, o Conselho Nacional de Secretários de Educação, a Associação Brasileira de Avaliação Educacional, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, a União Nacional dos Estudantes e a Defensoria Pública da União. As entidades solicitam a definição de um novo cronograma após a volta das aulas presenciais.
No Brasil, é notório que apenas uma minoria das escolas tem conseguido oferecer educação a distância de qualidade. Em geral, colégios particulares que atendem filhos de famílias com maior renda e escolaridade − fatores que, por si sós, contribuem para elevar o desempenho escolar. Sem acesso à internet e longe dos professores, por sua vez, estudantes de baixa renda podem ter dificuldades até para se inscrever no exame, a partir de 11 de maio.
A discussão chegou à Justiça: em abril, a Justiça Federal em São Paulo concedeu liminar determinando o adiamento do Enem, decisão revogada pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Por ora, o cronograma está mantido, com as provas em 1º e 8 de novembro (versão impressa) e 22 e 29 de novembro (versão digital).
O Enem é o maior vestibular do país: seleciona estudantes para mais de cem universidades públicas (quase 300 mil vagas) e mais de mil instituições particulares, além de mais de 400 mil bolsistas do ProUni. Foi criado para ajudar a democratizar o acesso ao ensino superior. Neste ano, corre o risco de fazer o contrário.