No folclore árabe, os gênios, bons ou maus, às vezes escapam de lâmpadas ou garrafas. É o que parece estar acontecendo no universo parlamentar. Nas casas, gabinetes, restaurantes, no cantinho do plenário, deputados buscam apoios de outros deputados nessa singular eleição para um mandato tampão para a Presidência da Câmara, vaga com a tardia renúncia de Eduardo Cunha. São tantos candidatos que às vezes eles se confundem e pedem votos até de concorrentes. Nem é por descuido. Ninguém sabe direito quem estará na cédula eleitoral nessa quarta-feira (13). |
Essa excitação coletiva ganha contornos teatrais no Cafezinho da Câmara. No final da tarde da terça-feira (12), retomou seu lugar ali um dos maiores animadores do pedaço, o deputado Lúcio Vieira Lima, o irmão mais descontraído do ministro Geddel Vieira Lima, articulador político do governo Michel Temer.
Lúcio andava meio distante, cuidando de outras tarefas depois do afastamento da presidente Dilma Rousseff. Foi até lá para medir a temperatura. Sentiu logo que ela estava quente. Em um cara a cara com o deputado Heráclito Fortes ouviu que Geddel teria se metido na disputa interna sobre quem seria o candidato do PSB à Presidência da Câmara. Lúcio negou, mas não convenceu.
Mal se refez dessa contenda, chegou o deputado Saraiva Felipe (PMDB-MG). Sem rodeios, ele colocou o dedo na ferida: a escolha do deputado Marcelo Castro (PI) como candidato do PMDB à Presidência da Câmara foi um explícito recado da insatisfação da bancada com o governo Temer. “Depois da derrota, agora o Palácio do Planalto nos chama para conversar. Poderiam ter evitado isso”.
Na sequência, passa pela mesa de Lúcio o deputado Fábio Ramalho, o Fabinho Liderança, e disse que também será candidato independente da decisão do PMDB. Depois, o próprio irmão do articulador político do governo chutou o pau da barraca. “Que decisão de bancada? vou votar em quem eu quiser”, desabafou Lúcio.
Curioso é que ao lado da mesa em que estava Lúcio, ouvindo as conversas, o deputado Miro Teixeira, decano da Câmara e hoje filiado à Rede de Marina Silva, calado, parecia refletir. Ele havia conversado com Marina sobre a possibilidade de entrar no páreo, não para pedir voto, mas para aproveitar a ocasião e fazer um discurso não dirigido aos deputados eleitores, mas, sim, à população, enojada com o comportamento dos políticos.
Miro pensava em se decidir na manhã desta quarta-feira. De repente, levantou-se e foi a seu gabinete preparar a sua inscrição na disputa pela Presidência da Câmara. Miro é o mais antigo deputado no exercício do mandato. Nem ele, nem quem veio antes dele, e provavelmente nem quem virá depois, teve, tem ou terá a oportunidade de assistir a eleição tão surreal de alguém que será de fato vice-presidente da República nos próximos seis meses. Cargo ainda mais chave nesse momento em que não dá para arriscar o que vai acontecer, até porque tem em curso uma imprevisível Operação Lava Jato.