A ampla e irrestrita autonomia do Banco Central, dentro da agenda liberal do governo Jair Bolsonaro para melhorar o ambiente de negócios aos investidores nacionais e estrangeiros, pode ser barrada no Congresso Nacional.
O PLP 112/19, enviado pelo Executivo, que tramita na Câmara dos Deputados, e o PLP 19/19, no Senado Federal, defendem ampla autonomia Banco Central e que seu presidente tenha mandato diferente do presidente da República. Assim, o próximo presidente do BC seria indicado pelo atual presidente da República.
O modelo segue o padrão do Banco Central dos Estados Unidos, o FED. Só que o FED, além de fazer política monetária, controlar a inflação, promover a segurança e eficiência do sistema e buscar taxas de juros moderadas no longo prazo, tem também o objetivo de maximizar o emprego e o desenvolvimento da comunidade.
A principal missão do Banco Central do Brasil, além de fazer política monetária, é controlar a inflação. Não está nos objetivos dos projetos apresentados “maximizar empregos” e o estimulo ao crescimento da economia, como se pronunciou recentemente o presidente do BC, Roberto Campos Neto.
O novo líder do Partido dos Trabalhadores (PT), o economista Enio Verri, está construindo apoio com aliados fora do campo da esquerda contra o projeto de autonomia do BC apresentado pelo Governo.
Autonomia é dar mais poder aos bancos
Segundo Verri, o Banco Central não tem sofrido intervenções sobre sua autonomia de conduzir a política monetária, independente da linha ideológica dos governante do País. A ampliação da autonomia do BC sem definição de novas missões, implicaria no risco de ampliar ainda mais o poder dos bancos de influir na definição das taxas de juros, hoje muito alinhadas ao Boletim Focus.
Na realidade, a autoridade monetária procura influir na formação de cenários de economia, especialmente em torno das expectativas de inflação para os bancos. As instituições expressam parte desta visão e suas próprias previsões no Boletim Focus, que vai contribuir para definição da taxa de juros básica. O fato é que o BC e os bancos nem sempre acertam nas previsões de inflação, como ocorreu em 2019, que acabou ficando acima do previsto.
“Defendemos a manutenção da atual política de autonomia do BC, bem como a ampliação de seu papel. No Brasil, o BC está mais ligado ao controle da inflação. Nos EUA, por exemplo, o FED, além da inflação, também cuida para que não se diminua o emprego do país. Queremos e devemos estender o papel do nosso BC e não entregá-lo”, disse Verri, ao se referir ao risco da instituição ser controlada pelo mercado financeiro.
Na prática, a autonomia já existe
Na realidade, a autonomia do BC vem sendo conquistada desde o Plano Real com enfrentamento dos riscos de crise no sistema financeiro e o combate à inflação mais pelo perfil dos dirigente da instituição do que interferência do governo. Ex-dirigentes do BC, como Gustavo Loyola, Pérsio Arida e Gustavo Franco deram grandes contribuições para a autonomia alcançada até aqui pela instituição.
A criação do Comitê de Política Monetária (Copom), destinado a fixar taxas de juros em um colegiado com diversos dirigentes do BC, foi um grande avanço de transparência, assim como a divulgação da ata das reuniões.
A grande diferença do BC para o FED, como aponta Enio Verri em seu Twitter, é que nossa autoridade monetária não tem como missão se preocupar com desemprego e taxas de juros moderadas de longo prazo. No esforço feito pelo BC para controlar a inflação, quando os juros estavam na casa dos 14%, o desemprego ultrapassou os 12 milhões de pessoas e a dívida pública foi para o espaço.
Hoje, temos juros básicos de 4,5%, o que dá uma grande ajuda na rolagem dos papéis do Tesouro Nacional, mas para o tomador privado de crédito o custo do dinheiro está nas alturas, o que desestimula o investimento. O Brasil não cresce, gera poucos empregos, mas o Banco Central manteve a inflação sob controle. Será que não está na hora do Congresso Nacional atribuir ao Banco Central, a exemplo do FED, o papel de se preocupar em reduzir o desemprego?
A impressão que se tem hoje é que a Taxa Selic contribuiu mais para reduzir a dívida do governo do que estimular os juros ao setor privado, especialmente porque o BC mantém bilhões de recursos de compulsórios, como se estivesse fazendo uma política monetária contracionista.