Fui uma rebelde aos moldes dos anos 1950 e 1960 do século passado. Mais ou menos, isto é, não fui beatnik nem hippie porque tive de trabalhar desde cedo para ajudar no orçamento familiar.
No mais, fiz de um tudo que as meninas de minha idade sequer sonhavam. A começar por ter sido líder sindical com apenas dezoito anos.
Piqueteira, sem medo, num universo predominantemente masculino. Investigada por um general e por um temido delegado do DOPS, logo após o golpe de abril de 1964, até hoje não sei quem ou o quê me livrou da prisão.
Vivi em Alvinópolis, Santa Luzia do Rio das Velhas (e, não “das Pedras”, como, erroneamente, escreveu Luis Nassif em sua biografia sobre Walter Moreira Salles), em Diamantina, nos anos dourados de JK, a quem conheci pessoalmente. Morei em Belo Horizonte, em Pittsburgh (EUA) e em Brasília. Ao todo mais de duas dezenas de casas e apartamentos diferentes.
Identificada sempre com os interesses dos “de baixo”, torcia para os índios nos filmes de faroeste e acabei ajudando a fundar o PT. Fui a primeira candidata ao governo de Minas Gerais por este partido, em 1982. Depois, deputada estadual e por duas vezes deputada federal, chegando, até mesmo a ser líder de bancada na Câmara dos Deputados, sempre com a fama de “dona onça”.
Desfiliei-me do PT quando Lula apontou Dilma Rousseff como candidata à sua própria sucessão… Oscilei em acreditar no “mensalão” e no “petrolão”, pois conhecia – ou pensava conhecer – todo mundo envolvido, inclusive os que na sombra ficaram até hoje.
Lutava por um mundo ao mesmo tempo livre e sem desigualdades sociais marcantes, mesmo desconhecendo como poderia ser isso. A União Soviética, China ou Cuba nunca foram modelos para mim.
Mas o “desenvolvimento das forças produtivas” como requisito para alcançar a igualdade social me impedia de constatar o que o progresso fazia, de fato, com essa nossa casa comum. Por isso gostaria de ter sido essa pirralha, que, hoje em dia, galvaniza mentes e corações mundo afora.
A liderança de que precisamos
Se essa pirralha tivesse sido uma liderança no Brasil, com certeza não teríamos ficado à mercê de um guru aloprado, a Terra continuaria a ser redonda e o homem de há muito já teria ido à Lua. Porque ela respeita a ciência e não tem ataques de loucura quando o que se anuncia como imprescindível pela manhã torna-se supérfluo à tarde ou é simplesmente ignorado no dia seguinte.
Greta Thunberg luta pelo que conhece e com a garra dos que se sabem presos a uma doença (Asperger), que faz com que veja o que certa família presidencial não vê, quiçá porque não são bons de cabeça.
Fosse essa pirralha sueca uma líder política entre nós, os índios não estariam sendo mortos às pencas no Brasil. Não haveria derrame de óleo em praias que já foram listadas entre as belas praias do mundo, nem ocorreriam queimadas que abatem a Floresta Amazônica. Gente pobre não estaria sendo morta como gado nos pancadões de fim de semana. Greta, por ser jovem, sabe que jovens precisam de belos espaços para o lazer, para o esporte, para atividades culturais e o entretenimento.
Seria tudo tão diferente que nem seria preciso que a pirralha fizesse greve nos estudos toda sexta-feira. Essa pirralha é tudo de bom. Como há poucos dias disse o veterano jornalista Jorge Pontual, ela nos faz proclamar orgulhosamente, a despeito de nossas idades avançadas, que somos todos pirralhos.
* Sandra Starling é advogada e mestre em Ciência Política pela UFMG