Limpeza ideológica de Bolsonaro no MP vai fracassar

Presidente Jair Bolsonaro e a procuradora-geral da República, Raquel Dodge - Foto Orlando Brito

Já ficou claro no processo de escolha do novo Procurador Geral da República que a intenção de Jair Bolsonaro vai além de nomear um titular dócil e afinado com seu governo, na linha do “engavetador geral da República” de tempos passados. Os planos de Bolsonaro são mais ambiciosos: promover uma “limpeza ideológica” no Ministério Público, exterminando as idéias de esquerda e o foco na defesa das minorias e do meio ambiente. Vai ser muito difícil conseguir.

Nos últimos dias, além de entrevistar candidatos, o presidente tem se preocupado em alardear os critérios que vão nortear sua escolha. Em entrevista ao Estadão desta terça, por exemplo, disse que não quer “um cara que fique lá só preocupado de forma xiita com questão ambiental ou de minoria”. Ao mesmo tempo, informa a Folha, Bolsonaro vem deixando claro nas conversas com os candidatos que quer promover uma mudança de perfil ideológico no segundo escalão do órgão, colocando os principais cargos da PGR nas mãos de conservadores.

O subprocurador Augusto Aras, um dos nomes cogitados para substituir Raquel Dodge – Roberto Jayme/TSE

É muito improvável que Bolsonaro tenha sucesso em sua operação de limpeza ideológica do Ministério Público Federal. Há, sim, procuradores conservadores ou de direita dispostos a ocupar esses postos. Ocuparão. Mas a subordinação desejada pelo presidente dificilmente será obtida. Questão institucional. Ao longo dos últimos anos, o MP se fortaleceu tanto – até demais, como se vê nas conversas impróprias da Vaza Jato – que, segundo antigos integrantes, é mais fácil hoje que o procurador chefe seja enquadrado por seus chefiados do que o contrário.

Com a Constituição de 1988, os recursos dados por seguidos governos para fortalecer o Ministério Público e o reforço ao corporativismo na categoria, Não há como pensar em  retrocesso nas condições de temperatura e pressão de uma democracia.

Sede da PGR, em Brasília

Além de o MP, como instituição, ser independente, internamente cada procurador costuma ser cioso de suas própria independência. São pessoas que gostam de briga, afeitas à guerra de egos, que não vão se transformar em carneirinhos obedientes ao Executivo de uma hora para outra. Todo mundo ali tem história de vida.

Sem contar o fato de que a proteção às minorias e a defesa do meio ambiente estão entre os temas que mais despertam interesse entre procuradores e promotores de cabo a rabo do território nacional. Raquel Dodge, que sabidamente não é de esquerda, assumiu se comprometendo com eles. São valores que transcendem hoje as divergências políticas na instituição.

Jair Bolsonaro vai entrar numa luta inglória se insistir na reforma ideológica do Ministério Público. Seu escolhido poderá até lhe prometer isso, mas não vai entregar.

 

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