A maratona de depoimentos de Sérgio Machado, além de colocar o presidente em exercício Michel Temer na roda da Operação Lava Jato, é uma aula sobre a promiscuidade entre políticos e empresários no assalto aos cofres públicos. Em várias falas, ele diz que esse sistema de corrupção foi originalmente montado em 1946, ano, aliás, em que seu pai, Expedito Machado, começou a atuar no mundo político. Machado se refere a um tal “custo político” que, há décadas, vem sendo incluído nos preços de obras, compras e serviços contratados por todos os níveis de governo.
Com didática, Sérgio Machado expõe o “modelo tradicional” de corrupção, por ele adotado na Transpetro, que assegurava um mínimo de competitividade, a realização dos serviços contratados, e sem abusar de aditivos em que se aumenta o valor das propinas e o lucro das empresas. Ele narra os conflitos que teve com empreiteiros e políticos acostumados às farras de aditivos na Petrobras.
Na definição de Sérgio Machado, a Petrobras sempre arrotou ser a empresa pública mais regulamentada, controlada, fiscalizada e auditada, mas, na realidade, mostrava-se apenas como “a madame mais honesta dos cabarés do Brasil”. Segundo ele, a Petrobras e outras empresas e órgãos públicos inovaram na corrupção sem nenhum limite, destoando da boa e velha roubalheira nacional.
Nos depoimentos, Sérgio Machado se auto-intitula o “caixa” dos senadores Renan Calheiros e Romero Jucá. Conta como faturou propinas para seus padrinhos e dezenas de políticos dos mais variados partidos. Elenca, também, uma penca de lugares onde que é só apurar que a corrupção vai jorrar como um bom poço de petróleo: DNIT, Companhias Docas, Banco do Nordeste, Finasa, FNDE, Dnocs… É uma verdadeira metástase no Estado Brasil.
Entre seus padrinhos, José Sarney. No Anexo Sarney, em suas 400 páginas de depoimento, um detalhe chama atenção. Sarney, um raro caso de coronel da política que adora se mostrar com vítima, espalhou sua decepção por ter sido gravado por Sérgio Machado como se tivesse sido traído por um filho. Por essa versão, ele era grande amigo de Expedito Machado e convivia com o filho Sérgio desde criança. Aos procuradores, Sérgio Machado afirmo que conheceu Sarney em 1982, quando já era líder do Centro Industrial do Ceará.
Machado apresenta Sarney como um voraz cobrador de propina. Mais que ele, no entanto, era Renan, com quem chegou até a se desentender por causa da ganância, porque, diz, sempre queria mais. Afirma que o senador Edison Lobão, depois que assumiu o Ministério das Minas e Energia, cobrou um upgrade, queria ser o político do PMDB a receber a mais polpuda fatia de propina. Lendo os depoimentos de Machado, fica evidente que propina vicia.
A manchete óbvia dos depoimentos de Sérgio Machado é a inclusão de Michel Temer no rolo. Temer fica mal na história por dois motivos. Antes, ele havia negado a conversa com Machado em que teria pedido e acertado uma ajuda de R$ 1,5 milhão para a campanha de Gabriel Chalita à Prefeitura de São Paulo. O outro é que, por ter sido envolvido no escândalo, dá ares de veracidade à conspirata, gravada, entre o senador Romero Jucá e Sérgio Machado de que, em seu eventual governo, se estancaria a “sangria” da Lava Jato.
Michel Temer divulgou uma nota para rebater Sérgio Machado. Como todos os políticos, deu a resposta regulamentar que sempre pediu contribuição eleitoral dentro da lei. E acrescentou: “É absolutamente inverídica a versão de que teria solicitado recursos ilícitos ao ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, pessoa com quem mantém relacionamento apenas formal e sem nenhuma proximidade”.
Pois bem. Sérgio Machado disse que, depois de ouvir um pedido de ajuda para a campanha de Chalita do senador Valdir Raupp (PMDB-RO), teve um encontro com Michel Temer na Base Aérea de Brasília. Ali, segundo ele, acertou o tal R$ 1,5 milhão para a campanha de Chalita. Na nota de Temer faltou confirmar ou desmentir o encontro e o teor da suposta conversa.
Em suas múltiplas confissões, Sérgio Machado conta também como operavam os tucanos no governo Fernando Henrique Cardoso. Ressuscita mortos como Sérgio Motta e Sérgio Guerra. Detalha a contabilidade para eleger Aécio Neves presidente da Câmara e dá detalhes sobre pagamentos de propinas ao senador tucano. Diz, por exemplo, que Sérgio Guerra lhe contou que o ex-diretor de Furnas Dimas Toledo era apadrinhado e arrecadava propina para Aécio e seus aliados. A propósito, as falas mais contundentes sobre o envolvimento de Aécio com Furnas são atribuídas a falecidos, como Sérgio e o ex-deputado José Janene. Ele nega.