A extrema-direita não ganhou de lavada na eleição para o Parlamento Europeu, mas as demandas que levaram a seu crescimento terão que ser levadas em consideração pelos europeístas em Bruxelas, principalmente a imigração e o meio ambiente. O fim do domínio absoluto dos conservadores e sociais-democratas, depois de 40 anos dominando os rumos da União Europeia em Estrasburgo – cidade francesa sede do parlamento –, dará lugar a uma representação mais fragmentária.
Em disputa agora está a composição da governança da União, dividida em quatro braços: presidência da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu (BCE) e do chefes de política externa do bloco e do Conselho Europeu, que representa os líderes dos 28 estados do bloco.
E as divergências já começaram, passadas apenas 48 horas do encerramento da eleição. Reunidos em Bruxelas na terça-feira, líderes da União começaram as conversações sobre a escolha do presidente da Comissão Europeia – o poder executivo da União – ocupado atualmente pelo luxemburguês Jean-Claude Juncker, que só fica no posto até 31 de outubro.
A divisão começou entre os principais líderes da União. Angela Merkel indicou o deputado alemão de centro-direita Manfred Weber, em um encontro a portas fechadas entre os 28 líderes do bloco. O presidente francês, Emmanuel Macron não concordou. Diplomatas em Bruxelas disseram que Merkel ficou incomodada com o fato de Emmanuel Macron – que prefere um nome de centro-esquerda – ter desqualificado o seu candidato.
O resultado da eleição favoreceu os eurocéticos e seus congêneres de formatação nacional-populista de extrema-direita, mas o peso no Parlamento foi contrabalançado por um aumento dos Verdes e dos Liberais, tradicionalmente a favor da União. O crescimento do número de eleitores em vários países do bloco deu essa nova configuração ao Parlamento. Chegou a 10% em muitos países e no cômputo geral a participação passou de 42,16% em 2014 para 51% agora, num pleito em que o voto é facultativo.
O crescimento dos Verdes surpreendeu, principalmente na Alemanha, onde obtiveram 20,7%, ante os 10,7% de votos da eleição passada. O bloco democrata cristão, liderado pela enfraquecida chanceler Angela Merkel, teve um recuo de mais de 6% no número de votantes, embora continue como o maior representante alemão no Parlamento.
Os sociais-democratas alemães, por sua vez, foram os maiores derrotados, provavelmente porque se desgastaram ao formarem uma coalizão com Merkel nos últimos anos. A Alternativa para a Alemanha (AfD) se saiu pior do que se esperava e permaneceu atrás das duas legendas tradicionais do país.
Os Verdes e sociais-democratas conseguiram maioria em Espanha e Portugal e nos países escandinavos. O destaque é a Espanha, onde o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), de centro esquerda, obteve 32,8%, e o Partido Popular (PP), de centro-direita, ficou em segundo lugar. O Vox, de extrema-direita, foi o grande perdedor e obteve apenas 6,2% dos votos, ficando atrás do que tinha conseguido nas eleições espanholas em abril deste ano, quando conseguiu 10% das cadeiras do parlamento espanhol.
O resultado no Reino Unido refletiu o impasse do país. O Partido do Brexit, criado especialmente para a eleição do Parlamento Europeu, foi o grande vencedor.
Ficou com 31,7% do eleitorado, seguido pelos Liberais Democratas, com 18,5%. Os grandes perdedores foram o Partido Trabalhista (14,5) e os Conservadores (8,7%). Um resultado que pode indicar o que seria uma antecipação de eleição geral para a Câmara dos Comuns, como querem os trabalhistas.
O italiano Matteo Salvini se consolidou como um dos líderes da extrema-direita na parte ocidental da União, ao lado da francesa Marine Le Pen. A Liga, de Salvini, conquistou 30% dos votos dos italianos. Salvini já fala em criar um bloco nacionalista no parlamento chamado Aliança Europeia dos Povos e das Nações.
O partido Fidesz, de Viktor Orbán, da Hungria, conquistou 52% dos votos – o que corresponde a 13 das 21 cadeiras do país no Parlamento. Mas Orbán tem um problema: Apesar do Fidesz ser uma agremiação de extrema direita e anti-imigração, é filiado ao tradicional EPP (centro-direita) no Parlamento Europeu. Em março o EPP suspendeu o Fidesz por sua retórica antieuropeia.
Na Polônia o partido Direito e Justiça (PiS), de extrema-direita, obteve o apoio de 42,2% dos eleitores e deverá ficar com 24 dos assentos no Legislativo da União. De todos os membros da União Europeia, Hungria e Polônia são os mais autoritários. O Fidesz e o PiS dominam toda a cena política de seus países, implementando leis que restringem a democracia e a liberdade dos que se opõem às suas políticas.
Nos próximos dias e semanas veremos como se dará a convivência entre os centristas, – à direita e à esquerda – nessa nova composição do Parlamento Europeu. Os representantes do Partido Popular Europeu e os Sociais Democratas, que perderam a maioria absoluta no Legislativo da União, terão que compor com outras forças, como os Verdes, para que haja um mínimo de consenso nas decisões do parlamento e da Comissão Europeia.
* Luís Eduardo Akerman é jornalista e analista de política exterior. Ex-editor de Internacional do Jornal de Brasília.