O incômodo vice-presidente Mourão

Mourão enfurece a "ala ideológica" do governo com sua intensa agenda, contrapontos a Bolsonaro e até por participar em Harvard de evento em que o guru Olavo de Carvalho foi desconvidado. Os generais tentam baixar sua bola, mas querem mudanças no Itamaraty, Educação e Meio Ambiente

O vice-presidente Hamilton Mourão mantém uma intensa agenda país afora e tem sempre na ponta da língua um contraponto às controvérsias causadas pelo presidente Jair Bolsonaro. Os generais que participam do governo, seus amigos, avaliam que, mesmo sendo do estilo dele, às vezes ele se excede, o que acaba gerando um clima ruim no Planalto. Já até falaram com ele. A última conversa foi com o ministro Augusto Heleno, o mais ouvido e influente dos generais palacianos.

Presidente Jair Bolsonaro e o ministro das Relações Exteriores, embaixador Ernesto Henrique Fraga Araújo na cerimônia de Apresentação de Cartas Credenciais. Brasília, 08/03/2019 – Foto Orlando Brito

Mesmo com essas ressalvas, os generais consideram malucas as acusações do chamado grupo ideológico do governo — alimentado pelos gurus Olavo de Carvalho e Steve Bannon e o deputado pastor Marco Feliciano — de que Mourão estaria apostando na queda de Bolsonaro.

Hamilton Mourão, dizem os militares, está feliz por estar conseguindo fixar uma imagem própria e acaba se beneficiando com o festival de besteira de seus adversários. Suas críticas à transferência da embaixada do Brasil em Israel de Tel Aviv para Jerusalém e a discordância sobre o disparate do chanceler Ernesto Araújo, endossado por Bolsonaro, de que o nazismo seria uma movimento de esquerda, enfureceu a turma. “É uma conduta imoral, indigna e indecorosa”, reagiu Marco Feliciano, ameaçando Mourão com um processo de impeachment no Congresso Nacional.

Steve Bannon, depois de ter sido paparicado por Jair Bolsonaro no jantar na Embaixada em Washington, sente-se à vontade para meter o bedelho na política brasileira. “O vice-presidente está tentando mostrar que está preparado se Bolsonaro falhar. E isso não é aceitável por alguém que está no governo. Se quiser fazer isso, Mourão tem de renunciar amanhã de manhã e ir para a oposição”.

Tudo indica que a temperatura vai subir ainda mais neste fim de semana durante a viagem do vice-presidente aos Estados Unidos. Nessa sexta-feira (5), Hamilton Mourão participa em Boston de um painel na Universidade Harvard, promovido por estudantes brasileiros, e tem encontros com pensadores de esquerda como Mangabeira Unger. Várias outras autoridades e personalidades brasileiras, como Fernando Henrique Cardoso, o ministro Dias Toffoly, Fernando Haddad, Ciro Gomes,a deputada Tabata Amaral e o general Santos Cruz — também estarão presentes.

Bannon e Olavo

O problema é que Olavo de Carvalho, depois de ter participação confirmada, foi desconvidado semana passada sob a justificativa de que nenhum dos convidados topou dividir um painel com ele. Foi uma pancada em sua vaidade. Passou recibo pelas redes sociais. “Este ano estou feliz de ter sido desconvidado… Estou feliz de não ter de fazer uma longa viagem para dialogar com microcéfalos.” Steve Bannon foi solidário. Disse à Folha de S Paulo que a agenda de Mourão em Harvard “é uma tapa na cara do governo”.

Depois de Boston,  Mourão terá uma movimentada agenda em Washington. Além de palestras no Conselho das Américas e no Brazil Institute, do Wilson Center, deve se encontrar com o vice-presidente Mike Pence e parlamentares americanos.

Evidente que toda essa desenvoltura de Mourão incomoda também Jair Bolsonaro. Além de não gostar, nesse caso o presidente tem pouco a fazer, a não ser esperar que as gestões dos generais palacianos baixem um pouco a bola de seu vice-presidente. Os militares também querem que o governo dê menos pretextos para as críticas generalizadas e pressionam para que Bolsonaro promova mudanças no Itamaraty e nos Ministérios da Educação e do Meio Ambiente, redutos de seguidores de Olavo de Carvalho e assemelhados.

A conferir.

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