O dilema de Bolsonaro com seu próprio governo

Em 100 dias, Bolsonaro trava sua gestão por não conseguir -- ou não querer -- trocar o palanque pelo exercício da Presidência da República

Em seus primeiros 100 dias, período em que todo governo conta com uma trégua da oposição e boa vontade geral, a administração Bolsonaro surpreendeu o país pelo que menos se esperava de uma turma que parecia ter chegado com todo o gás ao poder: inapetência. Para dentro e fora do governo.

É uma inacreditável sucessão de pequenos tropeços, a maioria deles sem a menor importância. Briguinhas e bate-bocas de comadres ganharam relevância. Resultado: a popularidade de Bolsonaro caiu e até um apoio parlamentar que vinha por gravidade subiu no telhado.

Ministros Moro e Guedes. Foto Orlando Brito

O que mais impressiona é que a banda boa do governo mal pode se apresentar. Ela parece tocar sob a regência de outros maestros. Nessa quarta-feira, por exemplo, suas duas principais estrelas — Paulo Guedes e Sérgio Moro — brilharam no Senado, com defesas consistentes de seus ousados planos para a economia, a segurança pública e o combate à corrupção. Seus desempenhos pareciam sob medida para baixar a bola de uma tensão crescente no Congresso, alimentada pelos sinais confusos e contraditórios  por Jair Bolsonaro.

Ministro Onyx

O ministro Onix Lorenzoni e outros bombeiros também entraram no circuito com o mesmo propósito, tentando inclusive superar o mal estar com Rodrigo Maia, presidente da Câmara. Talvez por falta de melhor opção, as condições na Câmara e no Senado ainda continuam bem favoráveis a um mínimo de entendimento com o governo. O maior problema nessa relação nem é o alegado apetite fisiológico de boa parte da turma, mas o entrave interno que consome as energias dentro do próprio governo.

Em sua fala no Senado, Paulo Guedes cutucou a ferida: “Tem havido uma falha dramática. O governo que entra com uma apreciação popular enorme, em 60 dias envia uma medida anti-crime, manda uma reforma previdenciária, é um governo que está trabalhando. Quando ele parte o Congresso, o principal opositor do governo é ele mesmo”.

Apesar de todas as ponderações de seus generais e de seus assessores mais moderados, Jair Bolsonaro  continua na lógica do confronto que fez sucesso na campanha eleitoral. O que mais o sensibiliza são os gritos de guerra dos filhos e da trupe do desbocado guru Olavo de Carvalho. Essa turma cobra pesado de boa parte do governo alinhamento a suas ideias. E partiu para cima dos militares com cargos importantes no Palácio do Planalto que considera o principal obstáculo a seu projeto bélico: “Nenhum general disse uma palavra contra os inimigos do Bolsonaro, só contra os filhos e eu”, tuitou Olavo de Carvalho.

Ministro Osmar Terra. Foto Orlando Brito

Essa guerra nas redes sociais se espalhou pela Esplanada dos Ministérios e está imobilizando boa parte do governo. O interminável pega para capar no Ministério da Educação é o mais espalhafatoso, mas não é exceção. O Itamaraty passa por sua maior crise de identidade de todos os tempos. E as brigas se multiplicam. O pau está quebrando, por exemplo, no Ministério da Cidadania, onde Osmar Terra enfrenta a resistência do general Marco Aurélio Vieira, secretário especial do Esporte, que se recusa a escalar indicações políticas para a secretaria.

Alguns autores do desenho que mudou a geografia na Esplanada dos Ministérios, com a fusão de órgãos do governo, estão frustrados. Avaliam que, em vez de melhorar, piorou a gestão. “Deu muito poder a quem não consegue administrar e gerou muita ineficiência. Uma pena!”, lamenta um dos formuladores desse projeto.

A avaliação de gente com peso no governo é de que Bolsonaro precisa fazer um freio de arrumação, manter a pregação de suas bandeiras, mas evitar que elas sem nenhuma necessidade prejudiquem sua gestão. Parar de queimar munição de graça. A turma de Olavo de Carvalho, incluindo os filhos de Bolsonaro, entende que isso seria uma rendição a generais submissos ao establishment que sempre deu as cartas no Brasil.

O menor dos males desse cabo de guerra é paralisar o governo.

A conferir.

 

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