O Senado não tem hoje a imponência de outros tempos. Em parte por uma saudável evolução democrática, que muda os costumes, certamente apressada pelo desgaste do envolvimento de seus cardeais em sucessivos escândalos de corrupção. A chegada em fevereiro de senadores eleitos pela onda Jair Bolsonaro — sem experiência política e administrativa relevante — torna ainda mais distante a imagem de poder moderador exercido por parlamentares com longa vivência política.
Ainda assim, independente de seus componentes, o Senado, por suas exclusivas prerrogativas constitucionais, continuará como grande protagonista no jogo de equilíbrio entres os poderes da República. Um papel que, aos trancos e barrancos, sob forte cobrança da opinião pública, conseguiu exercer em meio a crise política, ética e criminal que atingiu boa parte de seus líderes e causou a deposição da presidente Dilma Rousseff.
No novo cenário político, com todas as incógnitas da ascensão de Jair Bolsonaro ao poder, a Câmara dos Deputados bastante renovada e ainda mais fragmentada, o Senado ganha ainda mais relevância. E seu comando também. Se a Câmara caminha para reeleger Rodrigo Maia na expectativa de que, sob sua batuta, será mais fácil a aprovação de reformas que destravem a economia, no Senado, além da agenda legislativa, outras questões estão em jogo.
A começar por suas regras. Quais os limites na relação com a gestão Jair Bolsonaro, um presidente que se elegeu sem ajuda dos políticos, tem forte apoio popular, respaldo militar, e é cioso de seu poder? Essa é uma questão crucial para quem sempre deu as cartas no Congresso, vem se esbaldando no tal presidencialismo de coalizão desde José Sarney, e deitou e rolou nos frágeis governos Dilma e Michel Temer. Noves fora, o toma lá, dá cá em todos os governos, e, principalmente, a corrupção institucionalizada exposta pelo Mensalão, Lava Jato e outras investigações que, de maneira inédita, puseram na cadeia Lula, Eduardo Cunha, Sérgio Cabral, Antonio Palocci, José Dirceu e grandes empresários.
Essa sucessão de escândalos e de crises teve forte impacto nas relações entre os poderes. Executivo e Legislativo perderam força. Só o Judiciário se fortaleceu. Está agora em pauta um reequilíbrio entre os poderes, com o apoio inclusive do ministro Dias Toffoli, presidente do STF. É nesse contexto que Renan Calheiros se apresenta como o candidato mais apto para a defesa das prerrogativas do Congresso. De acordo com seus defensores, os trunfos de Renan seriam a capacidade de articulação política, a maleabilidade para se aliar a ferrenhos adversários, e, se necessário, o destemor para peitar poderosos — três atributos que podem ter alguma serventia em uma gestão Bolsonaro.
Dizem que Renan está vendendo lote na Lua. Eles têm razão. Renan responde a uma penca de investigações. No comando do Senado, ele se tornaria o alvo mais vistoso da ampla mobilização nacional contra a corrupção — reforçada agora com a chegada da Lava Jato ao poder. Seria pura encrenca. Seus colegas sabem disso. Alguns até gostariam que Renan, em sua cruzada contra as investigações sobre corrupção, pudesse fazer um contraponto à anunciada ofensiva do ministro Sérgio Moro. Mas nem eles acreditam nisso.
O Senado busca um presidente que não se submeta a Bolsonaro, mas que também não se torne saco de pancada por envolvimento em escândalos de corrupção.
A conferir.