Não sei o porquê, mas as lembranças vêm em ondas, como a música do Lulu Santos. Hoje, por exemplo, conversa frouxa rolava com amigos quando uma dúvida foi subitamente sacada:
— O que o Bolão diria disso tudo?
A indagação ficou no ar. Nem todos conheciam ou conheceram o Bolão, então é necessária uma nota de rodapé antecipada e elevada do final da página. O nominado Bolão, na realidade, era João Batista de Abreu. Jornalista quase do Rio de Janeiro, nascido em Belo Horizonte, que migrou para Brasília e aqui viveu intensamente.
Taí, talvez seja essa a palavra para definir o Bolão: intenso. Pois bem, era um excelente tituleiro e fechador de jornal. Rápido, competente e certeiro. A rapidez o levou cedo demais, e a intensidade em tudo contribuiu muito. Mas o que eu quero falar mesmo é do seu imenso poder de síntese. Exercia com falsa modéstia essa habilidade. Tanto que declarava em alto e bom som o que deveria ser a manchete definitiva:
— Ainda vou fechar a primeira em oito colunas e cravando: Fodeu geral. Não teve tempo. Foi embora antes do vaticínio. Mas me pergunto aqui: por que essa lembrança agora? Sem pestanejar, respondo que está muito perto de foder geral. Eu tenho uma amiga (na verdade tenho várias) que é uma artista plástica muito boa, mas é também implicante como o quê, e implica comigo. Elvira pede que eu tenha calma; que dê um tempo; que seja generoso; que dê o benefício da dúvida. Por causa do imenso carinho que tenho por ela resolvi refletir. Fiz isso por quase cinco minutos e concluí que não há jeito. Vai dar merda. A história em Brasília teima em se repetir, trocando apenas os personagens. Quando Collor assumiu, o indefectível PC Farias tinha muito poder, assim como Zélia Cardoso de Mello, a czarina da economia de então.
Antes do próximo exemplo, uma historinha. Ninguém me contou, eu ouvi. Bem no início do breve período Collor, o então líder do governo, Renan Calheiros, cruzou no Senado com o ex-ministro Delfim Netto, que também já foi poderoso. Delfim cumprimentou rapidamente o alagoano e fez um alerta:
— Renan, esse governo vai ter vida curta. Tem caixa único.
Renan deu um sorriso de canto de boca e seguiu pelos corredores do Senado. O velho ministro da economia na ditadura tinha razão. E deu no que deu, como nos conta agora a história.
Já no primeiro mandato do Lula o todo poderoso era o José Dirceu, com o auxílio luxuoso de Antônio Palloci. Deu no que deu, como também nos conta a história.
Agora me vem um novo governo com dois ministros fortes, sem contar os militares. E além desses personagens, o novo presidente vai trazer para dentro do palácio os três filhos políticos os 01,02 e 03. Não tem como dar certo.
E o Bolão, lá onde foi morar, vai poder cravar em letras garrafais em oito colunas: FODEU GERAL.