Com seus 28 anos de mandato como deputado e três candidaturas como livre-atirador à presidência da Câmara – na última das quais obteve quatro votos -, não é possível que Jair Bolsonaro não perceba o risco. Basta lembrar da penúltima disputa, a de fevereiro de 2015, que elegeu Eduardo Cunha, derrotando a recém-reeleita Dilma Rousseff. Deu no que deu.
Quem participou de perto do episódio lembra que, no final de 2014, logo após a eleição, Cunha procurou diversos ministros petistas, já que a presidente não o recebia, com o seguinte recado: não queria o apoio do PT e muito menos do governo; só pedia a neutralidade, que não seria difícil de anunciar a partir do argumento de que a base do Planalto tinha mais de um candidato.
Cunha prometeu, segundo conta hoje um dos interlocutores procurados, que, em troca dessa neutralidade, teria uma relação pacífica com o governo. Dilma recebeu o recado, mas partiu para o tudo ou nada para derrotar Cunha, mobilizando ministros e aliados para apoiar o candidato petista Arlindo Chinaglia. Perdeu. Como se viu mais adiante, não apenas aquela eleição na Câmara, mas o próprio mandato, num processo de impeachment impulsionado pelo próprio Cunha.
É bem possível que alguém, lá no CCBB, tenha refrescado a memória de Bolsonaro sobre essa história – que, aliás, assistiu de perto na qualidade de candidato crônico ao cargo. Mas por enquanto o presidente eleito ainda parece desmemoriado, como se percebe por seu comportamento em relação ao principal candidato na eleição da Câmara, o postulante à reeleição Rodrigo Maia. Jair Bolsonaro está deixando vicejar diversas candidaturas em sua base, inclusive em seu partido, o PSL. Maia tem mandado recados duros, pedindo neutralidade – e só isso.
Todo mundo sabe que a família Bolsonaro – especialmente 01 e 02,que com ele disputam espaço no Rio de Janeiro – não quer a eleição de Maia. Tem o direito de não querer, mas não pode ignorar que os destinos do novo governo e de sua agenda de salvação reformista podem depender do comportamento do Planalto na eleição da Câmara.
As lições da história mostram o que pode acontecer com quem insiste em dar murro em ponta de faca, e tem a falta de sorte de perder a eleição…