Não gosto quando criticam o FB. Confesso que tenho extrema simpatia por essa ágora contemporânea. No início, impliquei com o anglicismo que nomeia a rede, mas logo percebi que era um espaço para se escrever e nunca convencer. Bom assim mesmo. Aí me chamaram para publicar aqui, em “Os Divergentes”, crônicas inéditas. Achei ótimo, só que já havia algumas que tiveram vida curta, apenas um dia. Tudo isso para dizer que o texto a seguir é inédito aqui.
Contam na Chapada Diamantina a história de um velho fazendeiro que não carece nominar. Homem rico, justo com os empregados, calhou um dia de virar viúvo. A falecida também era muito querida e foi muito pranteada. A solidão deixou o velho homem amargo, triste, sorumbático e macambúzio. Os amigos, solidários, procuravam entreter o bom homem. Levaram-no aos melhores cabarés da exuberante Chapada e nada.
Mal sabiam que a solução poderia ser caseira. O viúvo, mesmo guardando o luto, começou a olhar enviesado para a linda e brejeira filha da mais fiel das empregadas, a cozinheira. Vencendo a própria timidez e com muito jeito, revelou seu desejo para a responsável pela qualidade das refeições diárias. A princípio, a mulher não achou muito gosto, mas sucumbiu à ganância do quase inútil marido que vislumbrou, como bom canalha, a oportunidade de ascensão social em troca da própria filha.
Arranjo de cá, ajeito de lá, e resultado previsto: o velho fazendeiro casou-se com a jovem brejeira. Óbvio que o calor juvenil não encontrou frescor bastante para abafar. Logo se encantou por belo jovem da fazenda ao lado. E pronto, estava lá o clássico romance proibido. Alertado pelos amigos da situação, o velho fazendeiro preferiu fazer vista grossa. Afinal, o calor da jovem o acalmava e o que custava dividir um pouco alguém que o fazia tão feliz? E assim a vida seguia. Todos satisfeitos, desde que o amante fosse discreto e respeitasse certos códigos de conduta.
Mas, como todos sabem, o uso do cachimbo entorta a boca. Assim o jovem impetuoso adquiria cada vez mais liberdade.
Acontece que o velho fazendeiro era um homem de poucos hábitos, mas todos convictos. Único assinante do jornal A Tarde, de Salvador, esperava pacientemente a chegada do exemplar à pequena cidade da Chapada. Ninguém tocava até a primeira leitura, lida com avidez pelas notícias da capital. Um belo dia, depois da labuta na fazenda, o bom homem retorna para casa e encontra o impetuoso jovem no alpendre, sentado na cadeira de balanço de palhinha, lendo com primazia o jornal. Não teve dúvidas: sacou o revólver e executou o amante da jovem esposa. Entendia a traição, mas não a falta de respeito aos limites impostos. A sensação foi como se o folgado tivesse passado a mão na bunda dele sem consentimento.
Lembrei hoje dessa história, que me foi contada como verdadeira por um velho e querido amigo baiano. Mas o curioso foi a faísca que provocou a lembrança. Como de costume, assistia ao JN quando vi uma matéria sobre a afronta dos traficantes contra qualquer ordem estabelecida.
Passam a mão na bunda das forças de segurança. E acintosamente, à luz do dia. Que vergonha!
* vira-vira. Mamonas Assassinas.