A atriz Susana Vieira disse, numa entrevista à jornalista Sofia Patsch, que os parlamentares federais “são alienígenas”. Segunda ela, “eles foram colocados ali por alguma seita satânica”.
Não dá pra saber se eles têm parte com o Coisa-Ruim. Seria prudente, antes, consultar se o Tinhoso considera conveniente tais parceiros terrenos.
Mas certamente nossos políticos não são alienígenas. São terráqueos, parte vinda do Rio de Janeiro, onde mora a famosa atriz.
A frase de Susana Vieira não é novidade. Seu desabafo é um símile de outro repetido postulado: “Esse Congresso não me representa”.
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Vivemos há 33 anos ininterruptos numa democracia. O grau de informação dos eleitores é maior do que se prega.
Lula, porém, continua figurando em primeiro lugar nas pesquisas de intenção de voto à Presidência da República. As pessoas não estão desinformadas.
Cálice amargo
Isto não vale apenas para o companheiro-mor do petismo. Vale para a maioria dos políticos.
Uma das mais miseráveis do Brasil, a capitania do Maranhão foi extensão territorial da família Sarney por quase 50 anos. De acordo com aquele raciocínio novelesco, seus eleitores foram enganados o tempo todo.
O voto no Brasil é livre, secreto e universal. Quando se prega que o “congresso não me representa” e que seus ocupantes são “alienígenas” afastamos o cálice amargo da corresponsabilidade.
É outro viés da lógica do paternalismo. Por ela, todos são irresponsáveis (“que não pode ser responsabilizado pelos atos que pratica”).
Os 513 deputados federais e os 81 senadores (tirante os suplentes destes) são a cara do Brasil. Para o bem e para o mal. Susana Vieira, ao lado de grande elenco, nega este ponto de vista.
“Se isto for verdade,
basta extirpar esses poucos brasileiros “do mal”.
E deixar que a maioria, “do bem”, governe o País.”
“Só conheço o lado bom do brasileiro. Acho que aquele pessoal de Brasília não é o povo brasileiro”, diz ela. É juízo de valor falar em “lado bom do brasileiro”.
Mas não é um julgamento ver o Parlamento como um imenso espelho de seu povo. Afinal, os parlamentares não chegaram a Brasília a pé.
“Brasileiro bonzinho”
Deixar de encará-los pode expor o medo de ver nossa face refletida na lâmina d’água que guarnece o prédio do Parlamento. Quem votou, quem deixou de votar, quem gosta da política, quem a detesta, todos são corresponsáveis.
Não, Susana Vieira, eles não são alienígenas. Muitos deles vêm, inclusive, do Rio de Janeiro, terra arrasada em grande parte pelas sucessivas administrações livremente sufragadas por cariocas e adjacentes.
Se os moradores do Rio acham que seus 49 representantes federais não prestam têm o direito de mandá-los de volta pra casa. Que tal aceitar o desafio do senador Edison Lobão, dono de oito mandatos?
“Se alguém acha que a atividade política está tão ruim assim, ingresse na vida pública para tentar melhorá-la”, provocou o hoje senador. Aliás, Lobão faz parte do clã da família que conduziu o Maranhão por quase 50 anos.
De acordo com a lógica do paternalismo, os maranhenses não são culpados de nada. Seus votos saíram sem querer querendo. Enfim, a culpa da sua miséria é exclusiva dos políticos.
Se isto for verdade, basta extirpar esses poucos brasileiros “do mal”. E deixar que a maioria, “do bem”, governe o País.
Norte-americana, a atriz Kate Lyra conhecia bem os nativos da terra que a adotou. “Brasileiro é tão bonzinho”, repetia ela nos anos 1970. Naquela época, ninguém era ingênuo de acreditar no bordão da loira sestrosa.