Na entrevista à competente e séria Mônica Bergamo, na Folha, o ex-presidente Lula foi pródigo em recados. O mais óbvio é uma espécie de “não desanimem” à militância e aos simpatizantes petistas para que continuem acreditando em sua candidatura – fator essencial até para, mais à frente, indicar e tentar colocar um substituto no segundo turno, hipótese que não admite hoje. Lula diz que não vai se matar, não vai fugir do Brasil e vai brigar até o fim com o objetivo de manter sua tropa unida.
Há também muitos recados para o mundo político em geral, aliados e adversários. O mais interessante deles para Michel Temer, de quem Lula fala até com certo tom de admiração quando diz que Temer teve uma vitória contra a TV Globo, que supostamente quereria derrubá-lo. Nessa afirmação, o ex-presidente se colocou ao lado do atual, na mesma situação , tendo como adversários comuns, além da Globo, Rodrigo Janot e Joesley Batista, vítimas de um hipotético golpe.
“Ora, o Temer resolveu enfrentar. Teve a coragem de desmascarar o Janot, o Joesley e ficou presidente”, disse Lula, ressaltando que continua pensando “o mesmo” de Temer mas que é preciso reconhecer o “fato histórico”.
Como ninguém sabe o futuro, o aceno de Lula a Temer está sendo interpretado por alguns como um recado de que, se ele ou a esquerda vencerem a eleição, pode haver conversa depois – que é justamente o que um ex-presidente investigado precisa para manter o foro privilegiado com cargos ministeriais ou embaixadas futuras. E aí estamos falando de Temer.
Lula fez também um enorme favor ao tucanato ao elegê-lo seu principal adversário, praticamente ignorando o segundo lugar nas pesquisas de Jair Bolsonaro. Ao dizer que a eleição presidencial deste ano deverá ficar mais uma vez entre o PT e o PSDB, e que ninguém se elegerá à esquerda sem um e , à direita, sem o outro, deu a Geraldo Alckmin um patamar que hoje, pelas pesquisas e pelo apoio do establishment, ele não tem.
Na verdade, Lula, com isso, quer botar a corrida eleitoral em terreno seguro para ele, sem novidades.
Mas o recado mais claro de todos foi para o candidato do PDT, Ciro Gomes, que, para variar, anda falando demais. “O Ciro ou vai para a direita ou não pode brigar com o PT”, disse Lula. A tradução política disso é que, lá na frente, o ex-governador do Ceará e ex-ministro do PT poderá, sim, ter o seu apoio, mas que, por enquanto, o que Lula diz nas entrelinhas é: cala a boca porque quem manda na esquerda sou eu…