Um ano atrás, até onde a vista de Geraldo Alckmin alcançava o horizonte lhe parecia azul. Ele vinha de um estrondosa vitória eleitoral em São Paulo, com seus candidatos dando uma histórica surra nos adversários, inclusive nos mais tradicionais redutos petistas.
Seu poste João Doria foi quem mais brilhou. Alguns meses depois, Aécio Neves, o único rival de peso no tucanato, mergulhou de cabeça no pântano da corrupção. As gravações em que Aécio pede dinheiro ao dono da Friboi e a grana é entregue em malas a seu primo Fred merecem figurar no livro de recordes, pela rapidez em que transformaram 51 milhões de votos em pó.
Com Aécio fora do jogo, seria a hora e a vez de Alckmin. Não foi bem assim. O tombo de Aécio foi tão forte que abalou os alicerces até de seus adversários no ninho tucano.
Alckmin também sentiu o tranco.
Mesmo assim, livre de concorrentes no partido, optou pela tática de jogar parado.
Doria viu o vácuo e, afoito, partiu com tudo para atropelar o padrinho político e ganhar cacife na disputa pelo Palácio do Planalto.
Após queimar a largada, Doria tropeçou nas próprias pernas. Mas já havia causado estrago suficiente para abrir os flancos da candidatura Alckmin, que empacou, tornou-se vulnerável.
Um ano depois, o horizonte parece turvo. Basta uma leve brisa para Alckmin pegar resfriado. Até flores do recesso, como as candidaturas Henrique Meirelles e Rodrigo Maia, viram espinhos em seu caminho.
Mesmo entre os tucanos, sua vida ficou difícil. Não sabe, por exemplo, como se livrar do desafio de Arthur Virgílio, que bate sem dó em seus pontos frágeis.
Doria, que havia recolhido os freios, voltou à cabeceira da pista. O propósito aparente é de decolar para o Palácio dos Bandeirantes. Nos cenários que tricota com Michel Temer, uma mudança de rota, rumo ao Palácio do Planalto, já aparece como hipótese.
Ao deixar no ar a possibilidade de apoiar Márcio França, hoje no PSB, na disputa pelo governo de São Paulo, Alckmin troca de figurino com Doria — de traidor, ele pode posar de traído.
Outro desafio para Alckmin é se esquivar das estocadas de Fernando Henrique Cardoso. Sem abdicar do papel de conselheiro de Alckmin, FHC se diverte ao incensar Luciano Huck com conselhos, confetes e serpentinas.
Assim, ele põe pilha em Huck para se tornar a principal novidade do páreo presidencial.
Esse lado meio bruxo é típico de FHC. Faz isso até com amigos de verdade, como José Serra. Quem acompanhou de perto os bastidores da campanha de 2002 se convenceu que, mesmo apoiando Serra, Fernando Henrique torcia pela vitória de Lula.
Um desejo que nem ele mesmo mantinha secreto. Quem olhava de fora via uma fantasia, alimentada por outros acadêmicos de esquerda, sobre a passagem de bastão do intelectual para o operário.
O próprio Serra, resmungão por natureza, costuma atribuir sua derrota para Lula ao aumento da gasolina, autorizado por FHC, em plena campanha eleitoral.
Huck entrou no caldeirão da sucessão presidencial como alternativa a uma eventual polarização entre Lula e Jair Bolsonaro. Sacudiu daqui e dali, depois recuou.
Volta ao tabuleiro justamente quando há consenso de que Lula será barrado pela Lei da Ficha Limpa, sua prioridade agora é escapar da cadeia.
Dessa vez, Huck entraria no páreo não mais como adversário de Lula, mas candidato a herdeiro, especialmente no Nordeste, de parte de seu espólio eleitoral.
Todo esse frenesi sequer é garantia de espetáculo. Huck ainda vacila. Nada assegura que ele vá topar o desafio.
Dentro ou fora da disputa, o seu flerte com FHC expôs ainda mais a atual fragilidade de Alckmin, cujo horizonte anda turvo.
Na natureza e na política, o tempo sempre pode virar.
A conferir.