Nunca antes, na história recente deste país, um sujeito meteu tanto medo no establishment político e econômico do que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A esperança de muita gente de se livrar dele está criando teses e narrativas amarradas ao resultado do julgamento desta quarta-feira que, ao fim e ao cabo, podem passar longe da realidade. Pior, muita gente que está do lado do ex-presidente está embarcando nelas.
Por exemplo, a de que existe uma distância abissal entre uma hipotética condenação por unanimidade, com um 3 x 0, e uma por 2 x 1 – sendo este último resultado apontado por lulistas como uma “vitória”, em tom de prêmio de consolação. Não é bem assim. Vitória é absolvição, possibilidade hoje considerada quase impossível segundo a lenda urbana.
Mas a condenação por unanimidade também não terá o efeito de eliminar Lula da face da terra, que é o outro lado desse raciocínio, e nem impedir que vá empurrando sua candidatura até outubro. É claro que a divergência dos 2 x 1 abre espaço para mais recursos e dá a eles mais tempo de tramitação – o que não deixa de ser uma vantagem, além do fator simbólico da discordância interna.
Mas a manutenção da candidatura Lula em condições viáveis depende mais de fatores políticos externos ao TRF-4. Por exemplo, o tamanho das manifestações a favor do ex-presidente e o apoio de setores da sociedade, incluindo aí os partidos e movimentos de esquerda. Se for bem sucedida a estratégia de reafirmar a candidatura e, no dia seguinte, reunir partidos de esquerda em torno de um programa mínimo e uma perpectiva de acordo num segundo turno – ou até num primeiro, inclusive com a possibilidade teórica de apoio do petista a outro nome, se vier a morrer na praia jurídica -, ele pode seguir na liderança dessas forças.
Ao mesmo tempo, será preciso aguardar as próximas pequisas eleitorais para avaliar o efeito TRF-4 no eleitorado. Terá um julgamento unânime, e a narrativa que se dizer dele, o poder de tirar votos de Lula? Ou, ao contrário, a condenação o fortalecerá na estratégia da vitimização? Ninguém saberá responder a isso, nem hoje nem amanhã.
Da mesma forma, decisões externas poderão ajudar a definir o destino se Lula. Se o STF voltar a se reunir para rever a interpretação sobre a prisão após condenação em segunda instância, por exemplo, o risco de cadeia – que não é imediato mas existe – estará afastado. E a Lei da Ficha Limpa, que impede candidatura de condenados claramente enfraquecida.
Isso depende, é claro, de muitos personagens e instâncias jurídicas, já que haverá também recursos criminais ao STJ e eleitorais ao TSE. Mas tudo se dará sob o imperativo da política, de acordo com o roteiro que se desenrolar nas proximas semanas nas ruas e nos gabinetes.
É a isso que petistas e anti-petistas deveriam prestar mais atenção, pois há duas coisas nesse jogo: o julgamento e a narrativa julgamento.