Eduardo Cunha sabe que perdeu o bonde da delação premiada. Sempre soube que era uma negociação difícil — nunca teve um pingo de confiança do Ministério Público –, e sua queda e prisão haviam virado um marco no combate à corrupção e à impunidade no país.
Mesmo assim alimentava a expectativa de conseguir uma vaguinha nas cadeiras finais de algum vagão. Depois da queda de Dilma Rousseff, em que foi protagonista, imaginou que poderia escapar usando outra carta valorizada em seu baralho viciado.
O nome do jogo virou Michel Temer. Mais do que com Dilma, Cunha avaliava ter muita mais munição contra Temer. Em sua narrativa da história, Temer só virou vice de Dilma porque, em 2010, ele peitou o PT e vetou Henrique Meirelles, o preferido de Lula.
Meirelles hoje dá outra versão para sua saída do páreo. Diz que na undécima hora recusou o convite de Lula. Quem acompanhou de perto o jogo bruto do PMDB, orientado por Eduardo Cunha, sabe que não foi bem assim.
Para superar as desconfianças de Dilma, Temer e Cunha até simularam um afastamento. Na época, os jornais noticiaram uma briga entre eles. Cunha achava graça. No auge dessa suposta querela, ele sempre esteve próximo a Temer. Frequentava sua casa.
Claro que nem sempre viveram em lua de mel. Rusgas são frequentes nas relações entre políticos. Eles são muito competitivos.
Mas desde 2010 em vários momentos – e já escrevi sobre isso muitas vezes –, os conflitos entre eles foram meros jogos de cena. Assim foi, por exemplo, no jogo do impeachment.
A diferença dessa última parceria bem sucedida deles foi o desfecho: Temer ganhou a Presidência da República e Cunha foi parar no xilindró.
Ali começou uma nova partida.
Eduardo Cunha se considera um gênio em estratégias para ganhar dinheiro e vencer no jogo político. Em algum momento, quando ambos se confundiram, foi bem sucedido.
O fracasso não o abateu. Foi para a cadeia convencido de que seu talento nessas duas frentes o tiraria de lá.
Para isso, teria que manter a pose e a frieza em apostas diferentes.
Avaliava que tinha um coringa na mão. Dependia só dele. Para não fazer uma aposta errada, obter menos do que esperava, esticou o blefe com todos os parceiros na mesa do jogo.
Com as perguntas que apresentou em juízo a Michel Temer tentou amedrontar o presidente, que considera suscetível a pressões, e a seduzir a turma de Rodrigo Janot com uma delação premiada explosiva.
Foi atropelado pelo furacão Joesley Batista.
Seu operador Lúcio Funaro reagiu mais rápido à tempestade, entregou toda a turma, conseguiu a delação premiada.
Eduardo Cunha ficou de mãos vazias, sem ter o que entregar. Sua primeira reação foi acusar Funaro de ter roubado seu roteiro para uma eventual delação.
Tem precedente. Na cela que dividiam no Complexo Médico Penal, na região metropolitana de Curitiba, Nestor Cerveró, ex-diretor Internacional da Petrobras, pediu ajuda ao operador Fernando Baiano, também ligado a Eduardo Cunha, para preparar uma minuta de sua proposta de delação premiada.
Cerveró virou uma fera ao descobrir que seu roteiro virou o salvo conduto de Fernando Baiano. Sem ter o que entregar, instruiu o filho a gravar o senador Delcídio do Amaral, então líder do governo, e, como todos sabem, esse novelo continuou a ser desfiado.
O problema para Eduardo Cunha é que não lhe resta mais nenhum tipo de tábua de salvação na Justiça. A não ser uma hipotética ajuda de Temer.
No desespero, passou a defender Temer com unhas e dentes. O Palácio do Planalto bate bumbo. Eduardo Cunha virou fiador da narrativa palaciana de que Temer é vítima de uma conspiração urdida no Ministério Público.
Para Cunha, sem nenhuma perspectiva de se safar da Justiça, qualquer mãozinha é lucro. Nem precisa ser direta. Pode ser uma das versões de anistia, articuladas nos bastidores, que beneficie o próprio Temer, Lula, Aécio e toda a turma acusada na Lava Jato.
No caso de Cunha, se conseguir redução de algumas penas, já estará de bom tamanho.
A conferir.