João Dória está queimando as velas. No recente jantar com a cúpula do DEM, foi explícito sobre a disposição de abandonar a prefeitura de São Paulo para se aventurar na campanha presidencial por ter “perfil adequado” para vencer. É cada vez menor sua precaução em evitar a pecha de traidor no balaio de adjetivos pouco lisonjeiros usados pelos cardeais tucanos para definir as peripécias dorianas.
Ao se expor nessas articulações frenéticas com outros partidos, o prefeito atiça também o fogo que consome outro discurso seu, o do Papai Noel trazido por renas limpinhas para salvar o Brasil dos políticos sujos. Muitos analistas creditam sua desaceleração nas pesquisas de intenção de voto à profusão de evidências de que o discurso do gestor não-político era mesmo só para boi dormir. Como o próprio disse e repetiu muitas vezes, paulista não gosta de “gente como Lula”, que deixa de trabalhar para fazer política.
A imagem de salvador teria mais chances de sucesso se ainda não faltasse um ano para a eleição. É tempo suficiente para o eleitor mais inocente entender que nem tudo que reluz é ouro. A defesa de políticos “velhos”, como Michel Temer e Aécio Neves, a facada da criatura nas costas do criador, as costuras noturnas e o marketing calculado são ações típicas de um político como qualquer outro. É hora de ajustar a mensagem para não atrair outro adjetivo pouco apreciado pelo dono do voto, o de mentiroso.
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O mais recente argumento dos dorianos é que, se o prefeito trocar o PSDB pelo DEM, haverá revoada de tucanos tristonhos para vários partidos. É provável que se trate de uma miragem. O PSDB de Alckmin já contabilizou a perda da prefeitura de São Paulo, por mais frustrante que seja depois de arrancá-la do PT, e muitos até torcem pela saída de Dória. Quando isso acontecer, o governador une o partido em uma semana e se apresenta como a opção mais segura e confiável do centro contra o PT e os muitos aventureiros que estão selando as renas para marchar contra “os políticos”.
A história pode estar diante de um gênio da política, com força para se impor como líder da maior onda conservadora no Brasil desde 1988. Mas política é como nuvem, e a de Dória aparece meio parada no ar das pesquisas. Como homem de negócios e números, o prefeito da maior cidade do país não deveria queimar tantas velas antes de fazer todas as contas.