As duas principais notícias do dia precisam ser lidas em conjunto para se ter uma ideia do que pode vir. Perdendo popularidade num ritmo que, daqui a pouco, o levaria a um patamar abaixo de zero, se isso fosse possível, o presidente da República será denunciado nas próximas horas pelo Procurador Rodrigo Janot por corrupção, mas vai lutar e espernear, usando todas as armas até o fim. Ao mesmo tempo, na contagem regressiva para receber uma sentença condenatória do juiz Sergio Moro, o ex-presidente Lula reafirma sua liderança nas pesquisas para 2018, mostrando inédita resiliência.
Entre a presidência e a cadeia, poderia ser o título do filme, que em vez de um, teria dois protagonistas. O final ainda está em aberto, mas não restam dúvidas de que a próxima fase do jogo terá 2018 como protagonista. E que, até lá, não haverá espaço para mais nada na agenda política. Já se viu alguma vez o Congresso aprovar reformas em paralelo a um processo contra o presidente da República? Nunca.
Haverá condições de governabilidade? Poucas, ainda que Michel leve tempo para perder o apoio que hoje tem no plenário da Câmara, ou até não perca. Mas a ideia do Planalto de fazer um rito meio sumário, encolhendo prazos e votando a toque de caixa a denúncia na Câmara, com o objetivo de enterrá-la e tocar a vida, parece a cada dia mais remota. Em primeiro lugar, porque há prazos constitucionais e, possivelmente, haverá mais de uma denúncia contra o presidente.
Em segundo, e principalmente, porque sua base já sofre um processo de erosão, que pode ser mais ou menos rápido mas é quase inevitável nessas horas. Uma terceira notícia desta segunda, um artigo do ex-presidente Fernando Henrique na Folha, pedindo mais uma vez que Temer antecipe as eleições presidenciais e encurte seu próprio mandato, mostra que o indeciso PSDB já colocou um dos pés para fora do muro.
O que resta saber é como a variável Lula, com seu patamar de 30 % nas pesquisas, pode influir na sobrevida de Temer. E pode. Ainda que os tucanos saltem logo do barco, há uma chance de que o PT e a base lulista não tenham tanto interesse assim em mexer as coisas agora. Afinal, a sangria do ex-vice de Dilma Rousseff vem se mostrando positiva para o petista que cresce em cima dela. Qualquer mudança nesse cenário, com a substituição de Michel por um presidente indireto – que poderia até se dar bem e representar uma ameaça em 2018 – pode atrapalhar.
Vai ser muito, muito curioso mesmo, ver os petistas, em sessão aberta e televisionada da Câmara, votarem contra a denúncia de Michel Temer.