Em dois anos e meio de Lava Jato, o juiz Sérgio Moro só falou nos autos dos processos – ainda que muitas vezes de forma dura, em recados explícitos. Deve ter tido, portanto, suas razões para quebrar o silêncio e dar a entrevista publicada neste domingo aos repórteres Fausto Macedo e Ricardo Brandt, do Estadão, de longe a leitura mais interessante da rodada do finde. Interessante por quê?
Porque, pela primeira vez, Moro parece ter sentido necessidade de se explicar – ao distinto público, ao STF, aos políticos. Está falando porque parece ter perdido parte daquela aura de intocabilidade dos primeiros tempos da Lava Jato. Embora ainda muito popular, Moro vem recebendo críticas de setores do Judiciário e da mídia, que vão além dos prejudicados com sua ação contra a corrupção. É nesse contexto que deve ser entendida sua entrevista, em tom equilibrado, quase humilde.
Deu dois recados importantes: o de que jamais entrará na política e a defesa de um limite ao instituto do foro privilegiado, interpretado como uma cutucada no STF, que estaria demorando para julgar e condenar os acusados da Lava Jato. Mas Moro foi extremamente cuidadoso e afável com o STF, quase justificando a demora em função do excesso de processos que chegam à corte suprema do país por causa da amplitude do foro privilegiado. Há quem pense o mesmo no próprio STF.
O principal recado de Moro na entrevista foi, sobretudo, o que ele não disse. Indagado sobre a proposta que vem sendo articulada pela Câmara para anistiar o caixa 2, embutida no projeto das da medidas conta a corrupção, poderia ter batido, como bateu no projeto que endurece a punição ao abusos de autoridade. Só que não. Deu uma resposta para lá de moderada: “Creio que é prudente aguardar eventual formulação concreta antes de opinar”, disse ele, acrescentando que seria impensável uma eventual anistia de crimes de corrupção e lavagem, nos quais vem enquadrando os réus da Lava Jato.
A tradução desse recado de Moro aos navegantes do Congresso é que não vai atrapalhar a votação da anistia ao caixa 2 se as dez medidas contra a corrupção forem votadas direitinho. Pelo menos é isso que a turma entendeu.
O parecer do relator Ônix Lorenzoni deve ser lido esta semana, e sua votação na comissão especial das dez medidas poderá ocorrer já na próxima, enviando a proposta, junto com a anistia, imediatamente ao plenário da Câmara.