Num jogo em que ninguém tem controle das cartas, surpresas pipocam a todo instante, a dúvida é se a melhor alternativa é pisar no freio ou no acelerador. Em outros tempos políticos, sempre prevaleceu o que Paulinho da Viola traduziu no belo Argumento: “Faça como um velho marinheiro/ que durante o nevoeiro/ leva o barco devagar”.
Esse é o sonho de navegação de quem está no leme nos poderes da República. Michel Temer quer baixar a bola para manter sua base parlamentar, aprovar sua agenda de governo e conseguir sobreviver pelo menos até 2018. Tem feito isso com alguma competência, a ponto de não ser descartado como uma alternativa presidencial nas próximas eleições. Se não afogar durante a travessia, pode até chegar lá.
Dia sim e no outro também, Renan Calheiros é alvo das mais variadas denúncias. Ele tenta se manter à tona onde quase todos outros se afogaram. Sempre foi um exímio nadador em fortes correntezas. Seu bom desempenho era atribuído a frieza com que encarava águas adversas. Até agora não brigava contra marés. Dessa vez, encarou. Ganhou aplausos e solidariedade no Congresso.
Exagerou no tom. Desqualificou os juízes federais de primeira instância. Disparou com gosto contra o juiz Wasliney Oliveira, o “juizeco”. Atirou em Brasília, mas passou a impressão de que mirava longe daqui. Deixou transparecer que compartilha o mesmo temor de grande parte de seus colegas de parlamento diante das águas revoltas de Curitiba, onde o juiz Sérgio Moro nada de braçada. Que o diga Eduardo Cunha.
Com isso, Renan abriu espaço para receber um chega para lá da ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal. Depois de belas tabelinhas com o ministro Ricardo Lewandowski, inclusive na pedalada na Constituição em relação aos direitos políticos de Dilma Rousseff, Renan parece não ter entendido que há uma nova e bem diferente gestão no STF.
Daí Renan ter sido surpreendido, depois que acertou com Temer um encontro entre chefes de poderes, com a decisão de Cármen Lúcia de não comparecer. Ela alegou agenda cheia. A pizza nem chegou a ir ao forno.
E será no Supremo que o futuro a curto, médio e longo prazo de Renan será julgado. Como informou aqui em Os Divergentes Ivanir Bortot, começa semana que vem. Renan, claro, pode ganhar tempo, adiar o julgamento até o final de seu mandato como presidente do Senado. O que vem antes ou depois, depende menos de Renan do que da Justiça.