Então vamos combinar assim: o Ciro Gomes pode chamar o Lula de ladrão, atacar o Alckmin como socialista radical – e ter seus posts retuitados pelos ministros bolsonaristas – mas torna-se um sujeito sensível e muito magoado quando o petista faz “uma campanha odienta” pelo voto útil para ganhar no primeiro turno. Coitadinho do Ciro!
Vamos e convenhamos, o candidato do PDT tem todo o direito de dizer o que quiser na tentativa de ganhar votos, mas deve arcar com as consequências de suas escolhas. A principal delas, no momento, é ser ou não instrumento de forças que querem, de qualquer jeito, forçar a realização de um segundo turno – no qual já se sabe de antemão que ele não estará.
Antes de tudo, Ciro está, ainda que involuntariamente – pessoalmente, não acredito que seja de outra forma – fazendo o jogo de Jair Bolsonaro, cujo único objetivo deve ser adiar a derrota por um mês. Uma senhora ajuda, a julgar pelos posts do general Heleno, do ministro Fabio Faria e de outros bolsonaristas de quatro costados reproduzindo falas recentes do pedetista.
Uma outra camada de comprometimento de Ciro – e esta nada acidental – parece ser com o establishment, no qual se inclui a grande mídia, em seu esforço para forçar a realização de um segundo turno de qualquer maneira. Esse pessoal não tem mais ilusões quanto à reeleição de Bolsonaro, e nem a quer. Mas deseja ter um Lula mais dócil e flexível a negociações com os setores mais conservadores – o que ficaria mais difícil com uma acachapante vitória em primeiro turno.
Boa parte da mídia vem comprando a versão do Lula “odiento” que, pessoalmente, está fazendo campanha pelo voto útil para tirar votos do pobrezinho do Ciro – como se isso não fosse do jogo, qualquer jogo eleitoral, ou se tolhesse a vontade do eleitor.
Visão equivocada também por infantilizar a menosprezar a capacidade de discernimento de quem vota, dentro daquele que parece ser o movimento principal da maioria da sociedade brasileira neste momento: livrar-se do fascismo, derrotar o bolsonarismo.
Como dissemos acima, cada um é responsável por suas escolhas e, a partir delas, ocupará seu papel para a posteridade. O Ciro administrador competente e político de biografia correta, apesar de genioso, ainda tem chances de correr e pular no bonde certo da história.
Se não o fizer, pode ficar na dramática situação dos políticos que são bypassados pelo próprio eleitorado – até porque ninguém é dono de ninguém, e quem decide se haverá voto útil ou não é quem vota. Para Ciro, isso pode ser o fim