É no mínimo estranha, pra não dizer suspeita, a operação da Polícia Federal, batizada ‘Colosseum’, deflagrada nesta quarta-feira, para apurar possíveis fraudes e pagamentos de propinas a políticos e servidores públicos na construção do estádio Castelão, em Fortaleza, entre 2010 e 2013. Entre os alvos de busca e apreensão estavam os irmãos Ciro e Cid Gomes, que imediatamente acusaram o presidente Jair Bolsonaro de estar envolvido na ação da PF.
Claro que os desvios de recursos públicos precisam ser apurados a qualquer tempo. Não deve haver prescrição para esse tipo de crime. Mas, causa espécie a forma como a operação foi realizada, sobretudo por tratar-se de fatos ocorridos há mais de 10 anos, cujo inquérito foi instaurado ainda em 2017. Sem que ocorresse qualquer fato novo que justificasse a busca e apreensão, o juiz da 32ª Vara da Justiça Federal do Ceará atendeu a pedido da PF, não endossado pelo Ministério Público, e expediu os mandados de busca e apreensão, como se fosse possível recolher alguma prova em computadores e celulares atuais de supostos crimes cometidos há tantos anos.
Também não dá para misturar alhos com bugalhos, como estão fazendo alguns, e usar a expressão “método lavajatista” para tentar convencer aos incautos de que todas as operações da Lava Jato tivessem se realizado apenas por perseguição política.
O próprio Ciro Gomes faz essa distinção. Em entrevista à rádio CBN nesta quarta à tarde, ele lembrou que a Lava Jato tinha uma base. “Houve sim corrupção na Petrobras, ninguém dúvida. O Geddel foi flagrado com mais de R$ 50 milhões em um apartamento”.
A possibilidade de que exista de fato um componente político na operação Colosseum se torna maior por envolver um dos pré-candidatos à presidência da República. Mais que isso, acende uma luz amarela sobre o uso político de órgãos de estado. É que, como apontou o próprio Ciro Gomes em nota, além da distância temporal, ele não ocupava qualquer cargo público na época da construção do estádio.
O pedetista não poupou criticas ao presidente, afirmando por meio de nota que “Bolsonaro transformou o Brasil num Estado Policial que se oculta sob falsa capa de legalidade”. Mais tarde, em entrevista, ele reafirmou suas acusações de disparou: “Digo que Bolsonaro está interferindo porque vi a forma da escolha do diretor geral da Polícia Federal”.
O senador Cid Gomes, foi ainda mais enfático completou: “o atual diretor da PF é um medíocre, nomeado por ter ligações com a família do presidente”.
As acusações dos irmãos Gomes reforçam as denuncias feitas pelo então ministro da Justiça, Sérgio Moro, em abril do ano passado, quando deixou o governo. Moro denunciou que vinha recebendo pressão do presidente para mudar superintendentes e o próprio diretor-geral da PF que queria proteger parentes e amigos de investigações.
Se de fato a operação tem o envolvimento direto ou indireto do presidente será difícil comprovar, pelo menos por enquanto. Mas a última fala do general Augusto Heleno contra o STF, gravada durante um discurso de formatura na Abin, aumenta a desconfiança contra o governo, e reforça a tese de que Bolsonaro e sua trupe têm pouco apreço à democracia e, se não forem contidos, vão usar os órgãos de estado em beneficio próprio.
A Polícia Federal é uma instituição de estado e deve atuar como tal, em defesa dos interesses da sociedade e não de governos. Ao tentar interferir para beneficiar este ou aquele aliado ou intimidar adversários, presta um desserviço ao país. Afinal, não dá para prescindir do seu trabalho de investigação, sob comando da Justiça e controle do Ministério Público, entre outras atividades, no combate à corrupção e ao desvio de recursos públicos.