O ex-juiz Sérgio Moro mostrou que não tá pra brincadeira. Com um discurso articulado e consistente, apresentou propostas claras, tocando em pontos importantes como educação, saúde, segurança pública, economia e, principalmente, no combate à corrupção. Defendeu a união do país tentando demonstrar ter um projeto real de oposição à polarização Bolsonaro X Lula.
A filiação de Moro ao Podemos mexeu no tabuleiro político da sucessão presidencial ao entrar já empatando com Ciro Gomes no terceiro lugar. Mas mexeu também nos nervos dos adversários. O principal ícone da Lava Jato deixou claro que, ao contrário do que muitos imaginavam, aproveitou o exílio fora do Brasil para se preparar para a guerra. E pelo tom do discurso, o treinamento surtiu efeito. Tanto assim que a reação dos incomodados foi imediata.
Bolsonaristas e petistas mostraram que tem muito mais em comum do que gostariam de demonstrar publicamente. E usaram as mesmas armas para atacar o inimigo comum: as redes sociais. As máquinas de moer reputações de ambos os lados – muito semelhantes em suas práticas -, estão trabalhando a todo vapor com as suas baterias voltadas contra Moro.
De um lado os petistas tentam passar a ideia de que Moro e Bolsonaro são iguais, o que só convence aos devotos do lulismo que nunca se conformaram com a condenação do ex-presidente Lula por corrupção e com os estragos provocados pela Lava Jato contra o PT e seus aliados. De outro, bolsonaristas acusam o ex-ministro da Justiça de traidor e querem convencer aos incautos que a corrupção acabou no governo Bolsonaro.
Nessa quarta-feira, o general Santos Cruz, ex-ministro de Bolsonaro, após um encontro com Moro, pôs o dedo na ferida: “A polarização não ajuda o Brasil em nada. Hoje estamos tendo o Orçamento Secreto, que é um Mensalão, é a mesma coisa. São dois populistas que destroem a democracia da mesma forma, tentando comprar o Legislativo. Quando se analisa os dois vê-se que são absolutamente iguais”.
Mas o duplo bombardeio nas redes sociais é apenas uma parte da guerra que Moro terá que enfrentar, caso decida levar adiante sua candidatura ao Planalto. Os ataques surgirão de todas as partes e a primeira mostra do que estar por vir já foi dada ontem mesmo, logo após o discurso de filiação ao Podemos. O ministro Bruno Dantas, principal aliado do senador Renan Calheiros no Tribunal de Contas da União (TCU), determinou que procuradores da Operação Lava Jato devolvam gastos considerados irregulares com diárias e passagens.
Embora não seja diretamente atingido pela decisão, Moro é o principal ícone da Lava Jato e o parecer do ministro Bruno Dantas justo no lançamento da pré-candidatura do ex-juiz ao Planalto não foi um mero acaso.
Se continuar crescendo nas pesquisas, Moro corre o risco de ser o principal alvo dos candidatos durante a campanha, até mais que o presidente Jair Bolsonaro. Afinal, ao longo dos quatro anos à frente da maior operação de combate à corrupção no país, o ex-juiz amealhou muitos inimigos, milhares. Pior, todos muito poderosos, política e economicamente.
A grande questão que fica é: caso seja eleito, será que Moro terá condições de governar? Talvez tenha aprendido alguma coisa no curto espaço de tempo em que ocupou o Ministério da Justiça, mas creio que não seja suficiente para enfrentar as raposas, melhor dizendo, as ratazanas do Congresso Nacional.
Como presidente, terá que negociar com o Centrão, com petistas e com bolsonaristas, que continuarão a existir no Legislativo. Também será obrigado a conviver e até atender políticos acusados pela operação que comandou. Garantir a governabilidade sem ceder as pressões não será uma tarefa fácil.
Mais que qualquer outro nome, Moro terá que andar na linha sem poder desviar um milímetro sob risco de ser triturado. Mas isso é assunto para outro dia. Agora, resta aguardar os acontecimentos. A sucessão está só começando.