Dilma Rousseff começou bem. Fez um competente discurso de defesa, com emoção e pegada política, na medida certa para quem fala em narrativa a ser bombada por documentários cinematográficos. Contou também com a omissão e o receio dos que mamaram em seus governos e a abandonaram.
Digamos que a sua presença por si só neutralizou cerca de pelo menos um terço do plenário, que mudou de barco. São votos decisivos para sua cassação. Nem se abalaram. Quem trocou de lado, pelos mais variados motivos, não se deu a obrigação de explicar a mudança.
Na realidade, fizeram o mesmo jogo de Dilma. Nem eles e nem ela se explicaram. Com insinuações e ameaças, Dilma mostrou capacidade de dissuasão de investidas de quem algum dia esteve a seu lado. Mas, nas respostas às indagações dos senadores, se apegou a um suposto legalismo técnico em que não encarou os motivos reais de sua rejeição por mais de dois terços da população.
Se sabe de antemão – e ninguém tem dúvida de que ela sabe—que o jogo está jogado, ela poderia ter mantido em seu interrogatório o tom do discurso. Mas, além da surrada acusação de um suposto golpe, Dilma se escorou na defesa de que poderá ser cassada apenas pela abertura de três decretos sem autorização do Legislativo e o Plano Safra.
A bem da verdade, ela se saiu até melhor que José Eduardo Cardoso, avaliado como um craque em sua defesa. Começou e encerrou sua defesa com a mesma qualidade. Desempenho surpreendente para seus julgadores. Seu problema pode ter sido o mesmo de sempre: apostar as melhores fichas no marketing.
A realidade às vezes contraria quem acredita que a propaganda é tudo. Foi nesse script que Dilma apostou e simplesmente fugiu de todos os pecados de sua gestão no primeiro mandato. Por qualquer olhar alheio às paixões, é aí que os bichos pegam. Boa parte deles estavam na acusação contra Dilma subscrita pelos juristas Hélio Bicudo, Janaína Paschoal, e Miguel Reale Júnior.
Mesmo que Eduardo Cunha tenha suprimido o mais relevante de tudo isso da denúncia, ninguém a favor ou contra Dilma deixa de avaliar, para o bem e para o mal, seus dois mandatos como um governo de continuidade.
Não sei que pesquisas ou avaliações balizaram essa estratégia de Dilma. Para quem assistiu a sessão do Senado, cansativa, a impressão que ficou é que Dilma fez um jogo duplo: no discurso deu um recado para sua militância e registros históricos, nas respostas indicou que pode recorrer da derrota na Justiça. Quando achou que o embate havia acabado, conseguiu voltar ao jogo. A dúvida é se não foi tarde para o dilema de servir ao mesmo tempo a dois senhores, desagradaria a ambos.
Quem acompanha o dia a dia do Senado, não tem dúvida: Ela até vai aparecer bem no documentário que registrará a cassação do seu mandato. Mas, além de não recuperar o apoio de quem se sente por ela enganado, será cassada. Acabou.