Embriagado de si mesmo com o crescimento nos índices de popularidade – medidos por aquelas mesmas pesquisas que ele ataca e diz não acreditar – o presidente Jair Bolsonaro não faz ideia do que vem pela frente.
Primeiro foi o auxílio emergencial que deu aquela embalada nos números de sua aprovação junto ao eleitorado. Mas aí, em cada esquina, surgia uma confusão envolvendo a família. Isso, quando não era uma briga que ele tratava de arrumar com algum outro Poder, autoridade ou instituição.
Então, para aplainar o caminho, o que ele fez? O que os outros fizeram: o toma-lá-dá-cá, que ele esconjurou durante a campanha. E com quem? Com os de sempre, para os quais os outros também apelaram: com o Centrão.
Bolsonaro não se importa de voltar atrás, fingir que não disse o que disse, fazer as pazes com quem ele destratou ou por quem foi destratado. Sua relação com o PP, a base do Centrão, é assim. Ele foi praticamente escorraçado do partido, tratado como um zé-ninguém. Mas quem importa? Ele não. Na maior cara dura, passeia pra todo lado com o senador Ciro Nogueira, que manda agora no PP, como mandava no tempo em que praticamente colocou o presidente pra fora a pontapés.
Troca juras de amor, naquela que parece ser a única forma de analogia que ele sabe fazer – casamento, namoro, traição. A duras penas, e com várias recaídas (normalmente quando aparece mais um complicador com os quatro zeros ou a primeira-dama), ele tenta encarnar o Jairzinho Paz e Amor. E lá vamos em mais uma comparação com o ex-presidente Lula.
O ano de 2020 começou com uma queda de braço entre o presidente e o famigerado Centrão pelo controle de R$ 30 bilhões do Orçamento. Agora, Bolsonaro virou parte dele: abriu o cofre para Ciro Nogueira, nomeou Kassio Marques para o Supremo e tenta fazer de Arthur Lira, outro encrencado, o novo presidente da Câmara.
Muito se diz que Bolsonaro não ficou quase 30 anos impunemente na Câmara dos Deputados, que conhece as pessoas e sabe qual é o jogo. É uma meia verdade. Ele sempre foi um solitário deputado do baixo clero; não se sabe de grandes amizades que tenha feito, com uma ou outra exceção, e sua participação em grupos era mais periférica.
Ok, agora é diferente; ele é presidente, tem a caneta, seus apoiadores fiéis, alguma base de apoio na sociedade e entre os militares, e ainda bons índices de aprovação.
Mas acontece que o Centrão é formado por uma gente meio enrolada com a justiça. E, mais que isso, com muito apetite por verbas e cargos. Bolsonaro já deu a eles parte disso, mas eles querem mais e são especialistas em farejar dificuldades para aumentar o preço do seu apoio.
Nunca se sabe se, mais na frente, o processo relativo a algum deles vai caminhar. O mais provável é que não, dado o cerco que o presidente e seu entorno estão fazendo junto aos tribunais. Só que sempre existe ela, a imprensa, e algum escândalo pode estampar as manchetes.
E tudo isso, além de custar caro, sempre pode causar danos à imagem, ainda mais de quem jurou que não faria o jogo sujo. E isso lhe será cobrado, até pelos eleitores mais constantes. Alguns dos quais já começam a se ressentir da falta de apoio presidencial e o atacam na arena que ele, supostamente, domina, a das redes sociais. O Centrão, portanto, pode ser uma bênção, mas também uma maldição – que me perdoem a rima pobre.
Como diria o decano deste espaço, Andrei Meireles, a conferir.