Há algum tempo parte dos brasileiros vem trocando a prerrogativa cidadão pela mera condição de devoto de político. Esse tipo de postura não é necessariamente uma novidade. Nossa história é repleta de “heróis” forjados a partir de belas narrativas romantizadas de suas trajetórias, algumas brilhantemente construídas por marqueteiros.
A busca por um salvador da pátria é quase uma necessidade do povo brasileiro, carente de boas políticas públicas que lhes garanta educação, saúde, segurança, alimentação e moradia. Embora todas elas sejam asseguradas pela Constituição Federal, quando ofertadas à população são usadas de forma populista, servindo como moeda de troca ao governante.
Lamentavelmente, idolatria aos políticos tem se amplificado com o advento das redes sociais, que deu voz a devotos e robôs, ou a uma “legião de imbecis”, como disse o escritor e filósofo Umberto Eco ao criticar papel das novas tecnologias no processo de disseminação da informação.
Dessa forma, o debate político no Brasil se transformou em um campo de batalha maniqueísta. Nas redes sociais sobram agressões e xingamentos e faltam bom senso e racionalidade. Não importa a ideologia, o que vale é vencer a guerra de narrativas e promover o cancelamento do adversário, ou melhor, do inimigo.
Certamente os idólatras não fazem ideia do quão deletério ao país e à democracia é esse tipo de comportamento. O devoto não tem senso crítico, não enxerga os defeitos do ídolo, distorce a realidade dos fatos apenas para favorecer o seu “político de estimação”. E o mais grave: aceita pacificamente toda e qualquer explicação aos maus feitos flagrados, por mais absurda que pareça a justificativa.
O idólatra também não consegue se enxergar como tal, basta ver os inúmeros exemplos nas redes e na vida real. Fazem parte desse grupo de devotos aqueles que se acotovelam no cercadinho do Alvorada apenas para falar com o “mito”. Assim como são idólatras àqueles que acamparam em frente à sede da Polícia Federal, em Curitiba, para protestar contra a prisão de Lula, visto como vítima do sistema do qual se beneficiou por mais de uma década.
Para além do baixo nível da discussão, resta a preocupação de que em 2022 essa gangorra ideológica se mantenha. Afinal, se as pesquisas estiverem certas, o Brasil tem hoje, no mínimo, 50% do eleitorado formado por idólatras e não por cidadãos. O que é uma lástima!
O brasileiro precisa retomar sua cidadania e o protagonismo político da sua cidade, do seu estado e do país. E só o fará quando entender que político não é para ser idolatrado. Os nossos representantes – seja no Executivo ou Legislativo – são eleitos para atender aos anseios da população e não para defender os próprios interesses.
Os líderes políticos têm que ser constantemente cobrados e, flagrados em desvios, eliminados da vida pública pelo voto. As políticas em benefício da população executadas pelos governantes não podem ser vistas como um favor, mas pura e simplesmente como o cumprimento da nossa Constituição.
O Brasil não precisa de idolatras, precisa de cidadãos conscientes dos seus direitos e deveres.