O mundo assistiu ao primeiro capítulo da história da sucessão presidencial de 2024. A esperança, agora, é que os próximos debates se consigam manter o nível de educação e respeito.
O vice-presidente Mike Pence – do estado de Indiana – e a senadora Kamala Harris se encontraram em um confronto que foi mais civilizado do que o indisciplinado evento presidencial, mas contou com discussões acirradas sobre o covid-19, relações comerciais e políticas com a China, a geração de empregos e assistência médica.
Os dois estão com olhos voltados para as eleições de 2024.
O vice-presidente e a senadora entraram em confronto sobre a forma como o governo Trump lidou com a pandemia de coronavírus na noite de quarta-feira, com Pence defendendo o histórico da Casa Branca sem abordar suas falhas fundamentais, enquanto a democrata o acusou de gerenciar uma catastrófica política de saúde pública.
Kamala, a democrata da Califórnia que é a companheira de chapa de Joseph R. Biden Jr., fez uma denúncia abrangente das fracassadas políticas do governo Trump, que vão desde a economia e mudanças climáticas até a regulamentação e impostos sobre os planos de saúde.
Enquanto ela atacava Trump, o vice-presidente, sem sucesso, buscou rescrever o histórico do presidente sobre a pandemia e outras questões em termos convencionais e inofensivos, muitas vezes desafiando os fatos.
O vice-presidente, que é fã de carteira de Dan Mitrione – agente do FBI e conselheiro de governos da América Latina, onde atuou na década de 1960, colaborando com as ditaduras que governaram o Brasil e o Uruguai – fez afirmações enganosas ou claramente falsas sobre as políticas da Casa Branca em uma série de assuntos que pesaram sobre Trump na corrida presidencial.
Depois do fraco desempenho de Trump contra Biden na semana passada, o debate Harris-Pence em Salt Lake City, no estado de Utah, se destacou principalmente por ser diferente daquele trágico altercação.
Em sua maior parte, foi um caso de uso de luvas, mais semelhante aos debates políticos convencionais do passado, embora ocorresse em um momento de crise nacional.
A democrata usou o debate para atingir dois objetivos: tranquilizar os eleitores de que ela e Biden não são tão liberais quanto os republicanos afirmam, inclusive rejeitando as políticas que ela adotou durante as primárias democratas e para realizar uma série persistente de ataques contra o atual ocupante da Casa Branca.
Perto do final do debate, a moderadora, jornalista Susan Page do USA Today, direcionou a discussão para a legitimidade da eleição, perguntando ao atual vice-presidente se Trump concederia a eleição caso o democrata fosse declarado o vencedor.
Pence usou a pergunta para açoitar os democratas por se oporem ao presidente. Ele não respondeu à pergunta em questão, mas expressou confiança de que o país teria “uma eleição livre e justa”.
Houve tensão entre os dois candidatos desde o início, mas o debate prosseguiu como um evento muito mais ordeiro do que o encontro de briga de botequim entre Trump e Biden, durante o qual o presidente implacavelmente pressionou seu oponente em termos hostis. Pence, por exemplo, começou dizendo a Harris que era um “privilégio estar no palco com você” – o tipo de linguagem que Trump nunca usou. O que chamou a atenção de muitos telespectadores foi a mosca que pousou no cabelo do vice-presidente – e permaneceu por 120 segundos.
No fim, tudo acabou de certa forma se resumindo a uma questão de destino – a sucessão de Trump ou Biden em 2024. Mas, para o Brasil, Pence na presidência dos Estados Unidos, ressuscita o cheiro de quartel na Praça dos Três Poderes.