Debate da Band: O jeito é rezar

“Pela honra e glória do Senhor!” A frase foi repetida à exaustão pelo candidato do Patriota, Cabo Daciolo, durante boa parte de suas participações no debate da Band. Porém, pode ser definida como o resumo final do que foi apresentado pelos candidatos. Um festival de bravatas, propostas irrealistas e sem amparo técnico, que passam longe dos problemas mais graves e urgentes que assolam o país, e deverão ser enfrentados logo no início do próximo governo.

Os políticos mais experientes, Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro Gomes (PDT), conseguiram elaborar melhor os discursos quando acionados e deram respostas lógicas aos questionamentos. Entretanto, em termos de viabilidade, as propostas de ambos podem ser reprovadas. Ciro fala em limpar o nome de 63 milhões de brasileiros que estão no SPC. Como? Nem ele sabe. Também promete gerar 2 milhões de empregos no primeiro ano de governo, ao mesmo tempo zerar o déficit público em dois anos. Isso tudo num gravíssimo cenário de restrições orçamentárias. Além, claro de repetir a mentira, que o próprio Ciro já desmentiu, de que o maior gasto do governo é com juros da dívida pública.

Por sua vez, Alckmin repete a promessa de zerar o déficit público em dois anos, afirmando que irá cortar despesas. Tudo certo, exceto se o próprio governo não houvesse anunciado, hoje, que as despesas discricionárias, aquelas que o governante pode cortar, ficarão em R$ 95 bilhões ano que vem, abaixo do patamar de R$ 105 bilhões, considerado o mínimo para manter a máquina pública em funcionamento, de acordo com especialistas do setor público. O ex-governador de São Paulo vai além, e promete fazer todas as reformas possíveis no seu governo: Previdenciária, Política, Tributária e do Estado. Será que ele já combinou com os políticos dos partidos que compõem sua coligação e apenas sobrevivem através do parasitismo estatal?

Já a candidata da Rede, Marina Silva, tentou seguir a ideia que permeia sua atuação: não entrar em polarizações. Acabou, porém, defendendo uma agenda econômica semelhante à do PT, embora tenha em suas fileiras economistas que defendem o Teto de Gastos e a Reforma Trabalhista, tão criticados pela candidata. Destacou-se por tabelinhas enfadonhas com Geraldo Alckmin. Foi muito bem ao explorar sua especialidade, a pauta ambiental, mas foi pouco questionada sobre o assunto.

A surpresa da noite foi a postura comedida e cordial de Jair Bolsonaro (PSL), contrastando com a imagem briguenta e explosiva construída pelo deputado durante anos de atuação. Ao longo do debate, Bolsonaro defendeu a agenda liberal, sob influência de seu economista-Posto Ipiranga Paulo Guedes, chegando inclusive a soltar a frase: “o trabalhador terá de escolher entre todos os direitos e desemprego ou menos direitos e emprego”. Também cresceu ao falar de pautas conservadoras, como o armamento da população e a castração química para estupradores. Foi bem ao questionar Ciro Gomes sobre como tirar 63 milhões de brasileiros do SPC e ao fazer dobradinhas com Alvaro Dias (Podemos) para falar sobre corrupção. Disse também que resolveria o problema da Educação abrindo mais Colégios Militares pelos estados. Ora, fosse assim, após o Regime Militar, o país teria se transformado em uma potência mundial.

Entre os candidatos monotemáticos, encontram-se Alvaro Dias, o qual vai resolver os problemas do país levando Sergio Moro para o Ministério da Justiça e Guilherme Boulos (PSOL), que promete tributar os grandes bancos para solucionar os problemas fiscais brasileiros. Há também o candidato ininteligível: Henrique Meirelles (MDB). O ex-ministro da Fazenda, apesar do aclamado currículo, enrola-se todo para formular raciocínios e acaba não comunicando suas ideias com eficiência à população.

Por fim, o homem que roubou a cena na noite: Cabo Daciolo (Patriota). Sua performance foi um mix de pastor evangélico e radical propagador de teorias da conspiração. Alternava, em  alguns momentos, a defesa das corporações e de ideias totalmente irreais para a economia brasileira, como uma redução cavalar da carga tributária, ao mesmo tempo em que quintuplica a malha ferroviária do país. Chegou a dizer que o problema da violência era falta de amor.

Bizarrice: Daciolo ingressou na política através do PSOL. Outra bizarrice: Geraldo Alckmin falou em cortar o “Bolsa-banqueiro”, termo muito usado pelo PSOL e seu candidato Boulos. Mais outras, essa bem grave: ao comentar sobre a ideia de Ciro Gomes tirar 63 milhões de pessoas do SPC, Bolsonaro disse que a soma dessas dívidas poderia ser quase o PIB do Brasil. Uma rápida conta, aproximada, o PIB do Brasil é de quase R$ 6,5 trilhões; dividido por 63 milhões, chegaríamos à conclusão de que cada brasileiro inadimplente deve quase CEM MIL REAIS. O candidato disse que as dívidas foram feitas, por exemplo, comprando geladeira. Geladeira cara, hein?

A maioria dos candidatos encerrou a participação no debate agradecendo a Deus. O Estado laico definido pela Constituição passou longe. Assim como passaram longe temas como: nova regra de reajuste do salário mínimo, eventuais mudanças na Regra de Ouro e Teto de Gastos, proposta crível de Reforma da Previdência e aumento da eficiência do Estado na prestação de Serviços Públicos. Ao mesmo tempo, o governo atual anuncia que Previdência e Folha de Pagamentos do funcionalismo federal deverão consumir quase R$ 1 trilhão do orçamento no próximo ano. Com o nível no qual se encontra o debate eleitoral, o melhor a fazer é seguir os candidatos e rezar. Independente da crença.

*Victor Oliveira, mestrando em Instituições, Organizações e Trabalho (DEP-UFSCar). E-mail: ep.victor.oliveira@gmail.com

 

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