Lula inventa a prisão em câmera lenta

Lula agradece a solidariedade do povo em Porto Alegre Foto: Ricardo Stuckert

No melhor estilo Matrix, Lula criou a prisão em câmera lenta – o bullet time da Lava Jato, modalidade de efeito especial idealizada no cinema para mostrar a reação de personagens em período de tempo extremamente curto em contraponto à velocidade real dos eventos. Esquivou-se do mandado de prisão na sexta, 06, implodindo a escalada do Jornal Nacional e a manchete de todos os jornais neste sábado, com a habilidade de um Neo desviando de balas atiradas pelo Agente Moro Smith. Sabe que não pode ficar pulando de prédios e desaparecendo em cabines telefônicas para sempre, então vai se entregar, em dia e horário combinado. “O dia em que a história não aconteceu”, frase estúpida que li em algum site, é um bom resumo da decepção geral do establishment. O último roteiro entregue à mídia diz que Lula se entregaria depois da missa em homenagem à ex-primeira-dama Marisa Letícia, marcada para as 9h30 deste sábado, 07.

Falecida em fevereiro do ano passado, Marisa completaria 68 anos neste sábado. O ato foi convocado no Twitter pela senadora e presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann. É de um simbolismo arrebatador. Mas talvez Lula mude de ideia e, apenas especulando, permaneça em São Bernardo até segunda-feira, quando então o líder petista seria preso. Lula só quer controlar a cena. E os danos. Mesmo não podendo controlar a história que derivará desta cena. O filme tramado há tantos anos, como pretendeu forjar “O Mecanismo” de Padilha, já tinha o seu final antes mesmo do começo. Sérgio Moro, que já não consegue controlar a obsessão pela prisão de Lula, saiu desmoralizado do episódio, especialmente após determinar, atropelando a tudo e a todos, que ele se apresentasse à Polícia Federal em Curitiba até as 17h desta sexta. Lula ignorou solenemente. E passou a negociar diretamente com a Polícia Federal o timing de sua entrega redentória.

O combinado originalmente era que Lula se entregaria até a noite desta sexta, depois de discursar na própria sede do Sindicato dos Metalúrgicos. A opção foi compartilhada por aliados e pessoas próximas do ex-presidente. Os advogados do ex-presidente queriam que os agentes da PF fossem buscá-lo na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, mas os dois lados consideraram que havia risco na ação, devido à grande presença de militantes petistas e de outras frentes populares. Segundo a assessoria de imprensa da 13ª Vara Federal do Paraná, o ex-presidente Lula não pode ser considerado foragido e também não terá descumprido ordem judicial ao não se apresentar depois deste horário.

No Supremo, com tudo, as cartas continuam sendo incrivelmente previsíveis. A ministra Cármen Lúcia, presidente da Corte, decidiu na noite de sexta, 6, a manutenção com o ministro Edson Fachin da relatoria do pedido do ex-presidente Lula para evitar que ele seja preso. Segundo despacho da ministra, não houve “qualquer irregularidade na distribuição livre”, ou seja, no sorteio do relator. A defesa de Lula recorreu ao .STF depois de, na tarde desta sexta, o ministro Felix Fischer ter negado um pedido de habeas corpus apresentado ao Superior Tribunal de Justiça.

Fachin, Fischer, nada estranho.

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Jornalista e analista sênior de informações. Formou-se na Universidade de Brasília em 1987. Por mais de 20 anos, foi repórter, editor, correspondente e chefe de Sucursal em alguns dos principais veículos de comunicação do País: O Globo, Jornal do Brasil, Folha de S.Paulo, Istoé e Correio Braziliense. Trabalhou na FSB Comunicação, onde, por oito anos, foi diretor do núcleo de Mídia & Análise. É diretor de Atendimento da Santafé Ideias, no Rio, além de colaborador da Avenida Comunicação. Também é sócio-fundador da RMPJ e da Revista Tablado. Entre as premiações que recebeu estão o Prêmio Esso de Jornalismo, com a equipe de IstoÉ, e Menção Honrosa no Prêmio Vladimir Herzog. É pai de Bruno e Gabriela.