Eu sei o que você está pensando. Não há a menor chance da Corte Suprema, em plena guerra fratricida de egos e interesses, soltar Lula, preso desde 7 de abril – 75 dias nesta quarta, 20 -, que já reafirmou sua candidatura presidencial enquanto não lhe tirarem, além da liberdade, os direitos políticos. Lula solto não significa Lula elegível, essa decisão ainda dependerá de assumirem sua imolação em nome das divindades do Ministério Público e da Justiça. Mas imagine você: se preso Lula ocupa o espaço que ocupa, seja na confirmação de sua persistente dianteira nas pesquisas – numa linguagem clara: não tem pra ninguém -, seja pelas notícias que deixa vazar por meio dos que o visitam na cela em Curitiba, pense no que ele fará solto. Com estigma de mártir e o gogó limpo, diante de um teatro político nível Sodoma e Gomorra, com gente da grandeza de Geraldo Alckmin, Marina Silva, Rodrigo Maia e Jair Bolsonaro representando seus personagens bíblicos. Aliás, Bolsonaro fez uma live (transmissão ao vivo em suas redes sociais) enquanto tinha o cabelo cortado por um barbeiro. Ainda não entendi a mensagem oculta, mas fiquei torcendo pela navalha.
Não, não espero que Deus mande fogo e enxofre dos céus, até pelo perigo de quem pode vir a reboque, mas vejo o cenário político tão incerto e o mercado de apostas de nossa elite econômica tão ciclotímico e bipolar – com Temer, mais perdido que cego em tiroteio, correndo o risco de responder a um terceiro processo por malfeitos e a economia patinando feio -, que é possível pensar que uma parte do topo da pirâmide comece a elucubrar alternativas racionalizadoras antes impensáveis. E se deixarmos Lula livre e, mais do que isso, permitirmos que concorra? Nesta terça, 26, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal emitiu dois sinais interessantes. Absolveu a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffman (PT-PR) – uma das mais ferozes defensoras de Lula -, da acusação de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Por unanimidade. Ao apresentar a denúncia, a Procuradoria Geral da República afirmou que Gleisi e o ex-ministro Paulo Bernardo, seu marido, pediram e receberam R$ 1 milhão desviado da Petrobras para a campanha dela ao Senado, em 2010. Os ministros consideraram não haver provas de que o casal recebeu propina em troca da manutenção de Paulo Roberto Costa como diretor de Abastecimento da Petrobras à época. Gleisi também foi absolvida da acusação de crime eleitoral por 3 votos a 2. Prestem bem atenção nesse precedente.
Estaria a Segunda Turma preparando a soltura de Lula? Talvez, não. Mas e se… Teoria conspiratória vale para os dois lados. O presidente desta fatia da Corte, Ricardo Lewandowski, confirmou para a próxima terça, 26, o julgamento de um pedido de liberdade apresentado pela defesa do ex-presidente Lula. Um pedido de efeito suspensivo da execução da pena, que pode deixar o presidenciável favorito nas pesquisas aguardar em liberdade enquanto os recursos são julgados nas instâncias superiores. A defesa também quer que seja suspensa a inelegibilidade gerada com a condenação na segunda instância da Justiça. A defesa de Lula reitera argumentos até hoje solenemente desconsiderados, já apresentados ao próprio TRF-4, que apontam supostas irregularidades no processo, como incompetência de Sérgio Moro para analisar o caso, falta de imparcialidade no julgamento e de isenção por parte dos procuradores do Ministério Público.
Na petição enviada ao Supremo, a defesa do ex-presidente alega que há urgência na suspensão da condenação, porque Lula é pré-candidato à Presidência e tem seus direitos políticos cerceados ante a execução da condenação, que não é definitiva. Os mesmos argumentos que Sérgio Moro tem ouvido persistentemente das testemunhas de defesa de Lula, que faz questão de interromper ou mesmo calar – como lembrou Bernardo Mello Franco, em artigo no Globo. “Deixe as testemunhas falarem, doutor Moro”, propôs Bernardo, referindo-se aos constrangimentos impostos a Rui Falcão, ex-presidente do PT. A defesa de Lula vem repetindo isso até ficar rouca. “Além de ver sua liberdade tolhida indevidamente, corre sério risco de ter, da mesma forma, seus direitos políticos cerceados, o que, em vista do processo eleitoral em curso, mostra-se gravíssimo e irreversível”, argumenta. Além do espartano naturalizado Edson Fachin, a Segunda Turma do STF é composta pelos ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewadowski, Dias Toffoli e Celso de Mello.
Quem viver, verá. Falta pouco.