O prefeito tucano João Dória, que carrega na estampa e nas ações sua origem na elite paulistana, sancionará em breve um projeto de lei que, na aparência, homenageia a ex-primeira-dama, Marisa Letícia. Na verdade, o ato esconde um preconceito. A Câmara de São Paulo aprovou na segunda, 11, projeto que dá o nome de Dona Marisa Letícia a um viaduto no extremo sul da capital. Um desavisado dos tramites do projeto pode achar uma linda homenagem à mulher casada com Lula por 43 anos, morta em fevereiro deste ano, após um acidente vascular cerebral. A verdade é que a aprovação, em segundo turno, só ocorreu depois que vereadores concordaram com uma radical mudança no local. Para evitar polêmica com batedores de panela da Zona Sul de São Paulo, tiraram o nome de Marisa Letícia do local original da homenagem, a avenida na Chácara Santo Antônio, bairro nobre da capital – prolongamento da avenida Chucri Zaidan -, trocando-o por um viaduto em obras na região do M’Boi Mirim.
O projeto de lei original, assinado pela bancada do PT, ficou parado por quase 9 meses em razão da resistência de demais vereadores. Moradores do bairro pressionavam contra a aprovação do projeto porque não queriam a homenagem a Marisa Letícia em uma via de destaque da Chácara Santo Antônio. Diante do impasse, o presidente da Casa, Milton Leite (DEM), e o vereador Paulo Batista dos Reis (PT) apresentaram substitutivo que dá o nome de Marisa Letícia ao viaduto que se inicia na Estrada do M’Boi Mirim e termina na confluência da avenida Luiz Gushiken – outro nome ligado ao PT, ex-deputado federal e ex-ministro, morto em 2013 – com a rua Adilson Brito. O projeto de lei foi aprovado de forma simbólica pelos vereadores – sem votação nominal.
No último dia 9, antes do acordo geográfico, o vice-presidente da Câmara, Eduardo Tuma (PSDB), por orientação do Palácio do Anhangabaú, derrubou a sessão que votaria o chamado PL 81/2017 em segundo turno. “Fiz isso para evitar o constrangimento do prefeito em vetar”, admitiu Tuma, na época. Daí veio a ideia do acordão para desterrar a homenagem para bem longe. Talvez os nobres vereadores tenham achado que era um local mais apropriado para a mulher que nasceu em uma casa de pau-a-pique, no bairro dos Casa, sobrenome de seu avô, que tinha um sítio no interior de São Bernardo do Campo, no ABC paulista.
É simbólico que, na mesma votação, foi aprovado projeto de decreto legislativo de autoria do vereador Milton Leite para conceder a medalha Anchieta ao ex-ministro de Michel Temer, agora ocupando uma cadeira no Supremo, Alexandre de Moraes. A medalha é a maior condecoração do município. Os legisladores paulistanos têm mesmo seus critérios de Justiça.