E Carminha, quem diria, acabou no Irajá

Presidente do Supremo, Cármen Lúcia

E Cármen Lúcia, a ministra que veio redimir o Supremo, voltou a falar demais. E do mesmo réu. E do mesmo partido. Cármen Lúcia abriu na quinta, 01/02, os trabalhos do Judiciário em 2018, lado a lado com Michel Temer, mais Rodrigo Maia e Eunício Oliveira, nata da política, com um discurso que, disfarçado de defesa da Justiça, virou uma peça panfletária contra Lula e o PT. Numa fala sem improviso, disse ser “inadmissível e inaceitável” atacar a instituição. Não citou ninguém, nem precisava. Uma pessoa, disse ela, pode até discordar de uma decisão judicial, mas deve fazer a reclamação dentro dos “meios legais”. Para ela, “justiça individual” é vingança. Na semana passada, após a condenação de Lula no TRF-4, aliados do líder nas pesquisas eleitorais contestaram a legitimidade da decisão. Em nota o PT chegou a classificar o julgamento como uma “farsa judicial”. A pregação, por próceres petistas, de “desrespeito a decisões judiciais”, tem incomodado até gente de dentro de casa. Até aí, como diria o sujeito despencando do alto do prédio, é parte da queda.

O PT, estratégia ou não, foi over. Bem over. Mas não mais que o Senado ao ignorar decisão do STF e manter Renan Calheiros na Presidência da Casa. Não mais que Michel Temer ao barrar no Congresso, com métodos pouco republicanos, duas denúncias contra ele, preservando seu mandato. Não mais que o Senado ao derrubar decisão do Supremo que havia determinado o afastamento de Aécio Neves do mandato. E por aí vai. Então porque o discurso de Carminha só tem a direção do PT? Alguns dias atrás, na noite de segunda, 29, em jantar com empresários e jornalistas, a presidente do Supremo já avisara que a Suprema Corte vai se “apequenar” se usar a condenação de Lula a 12 anos e 1 mês de cadeia como pretexto para alterar a norma que prevê a prisão de condenados na primeira e na segunda instância do Judiciário. Norma, aliás, que faz parte do nosso revisionismo judicial. Se você acha que é correto que ela antecipe o seu julgamento em uma causa polêmica como essa, e longe do concesso interno, ande duas casas. E jogue os dados.

A decomposição da imagem de Cármen Lúcia coincide com a desintegração do Supremo, hoje tratado, sem ressalvas e cerimônia, como um tribunal passional e parcial. Cármen Lúcia, a presidente com dois acentos, tem cristalizado a crença de que o Supremo hoje é tudo, menos insuspeito, como já se sabe do Ministério Público. Como já escrevi aqui antes, a relativização do devido processo legal, do direito de defesa, da presunção da inocência e do ônus da prova chegaram ao seu grau supremo. Dogmas do nosso sistema jurídico, considerados intocáveis até algum tempo atrás, perderam para o revisionismo da Suprema Corte. Que começou, se bem lembro, quando o tribunal decidiu mudar seus paradigmas para condenar os réus da Ação Penal 470, o processo do mensalão. Levado pelos holofotes, pela transmissão ao vivo, pela irresistível e popular corrente condenatória. Princípios constitucionais construídos ao longo da vida não valem muita coisa nos tempos atuais. A Justiça hoje é tão cega quanto o telescópio Hubble. E o Gilmar Mendes preocupado com os apupos no avião. Bela desculpa para usar os aviões da FAB.

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