Tudo o que você queria saber sobre azeites

A Europa é responsável por 95% da produção mundial de azeites. Foi lá, começando pela Toscana, que o autor foi buscar inspiração para escrever sobre azeites, ingrediente indispensável na culinária. Os tipos de azeites, como usá-los na cozinha e desfrutá-los à mesa é o que o leitor vai saborear no artigo

Abadia de Sant'Antimo, obra dos monges beneditinos do século IX, na Toscana, Itália. Foto: João Alexandre

Em outubro de 2008 eu fazia um roteiro de visitas a vinícolas na Toscana, Itália. Num dos primeiros deslocamentos, passei pela Abadia de Sant’Antimo, vizinha à cidade de Montalcino. À primeira vista, o que me chamou a atenção foi a imponente construção do século IX ainda de pé, erguida pelos monges beneditinos, totalmente preservada. Um dos símbolos da arquitetura monástica medieval.

Logo em seguida, notei que a abadia era rodeada por oliveiras. Quando me aproximei, vi que algumas delas tinham placas indicando idades acima dos mil anos. Fiquei impressionado. Havia azeitonas nas árvores. Foi o meu primeiro contato direto com as oliveiras e seus frutos. Aquilo me fascinou.

A partir daí, visitei olivais em vários países europeus e tive o privilégio de provar azeites em algumas das principais regiões produtoras do velho continente. Na Itália, vi que os azeites expostos nas lojas especializadas eram quase sempre do ano. Em conversa com um lojista, ele me contou que quando chegam os azeites novos, as lojas fazem promoção das garrafas da safra anterior. Com isso, abre-se espaço nas prateleiras para um produto jovem e fresco. É esse azeite que os italianos gostam de consumir.

Diferentemente dos bons vinhos, que devem ser guardados para amadurecerem e evoluírem na garrafa, os azeites, quanto mais cedo forem consumidos, melhor. De preferência, devem ser consumidos no ano de produção. Isto para que seja possível aproveitar seu frescor e suas melhores características aromáticas e gustativas.

Óleo proveniente de uma fruta, o azeite de oliva, principalmente o extravirgem, agrega sabor aos pratos. É um tempero. Além disso, graças a seus bons polifenóis, ácidos graxos monoinsaturados e vitaminas, traz diversos benefícios à saúde. Uma gordura verde.

Produção mundial

Originária da Ásia Menor, a oliveira se alastrou pela região do Mediterrâneo há mais de 6 mil anos. A partir do século 2 a.C., tornou-se a principal gordura para a preparação de alimentos na Roma e Grécia antigas.

A Europa é hoje a maior produtora mundial de azeites e responde por cerca de 95% da produção mundial. Espanha (o líder), Itália e Grécia são os maiores produtores. Portugal também é uma importante referência de qualidade. Outros produtores são Tunísia, Turquia, Marrocos, Síria e Argélia. Estima-se que a produção mundial de azeite esteja em torno de 3 milhões de toneladas/ano. Há mais de 1 mil variedades de azeitonas catalogadas no mundo.

Produção no Brasil

Oliveira milenar da Abadia de Sant’Antimo. Foto: João Alexandre

O Brasil é o segundo importador mundial de azeite, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, segundo o Conselho Oleícola Internacional (COI). Este dado está estimulando a produção do óleo de oliva no Brasil. Os olivais nacionais concentram-se no Rio Grande do Sul e na Serra da Mantiqueira, nos estados de São Paulo e Minas Gerais. Santa Catarina, Paraná e Espírito Santo também produzem azeites, mas em menor escala. Olivais já aparecem também na Chapada Diamantina, na Bahia.

As azeitonas cultivadas no Brasil são a Arbequina, Picual, Koroneiki, Arauco, Coratina, Ascolano, Grappolo e Maria da Fé. Em 2018, o Ibraoliva (Instituto Brasileiro de Olivicultura) informava haver cerca de 320 produtores de oliveiras no Brasil. Já havia 60 marcas de azeites no país naquele ano.

A produção nacional tem cerca de 10 anos e responde por 0,3% do consumo nacional, segundo o Ibraoliva. O volume total de azeite importado em 2018 foi de 79,8 mil toneladas, segundo o COI. O consumo per capita/ano está abaixo de 400g no Brasil. Mas é um consumo crescente.

A classificação

Massa de azeitonas. Foto: Quinta do Vienzo

O azeite de oliva tem uma classificação mundial estabelecida, com base nos índices de acidez e métodos de produção, pelo COI. A normatização estabelece as seguintes classificações:

– Azeite extravirgem ou virgem extra

Obtido de azeitonas sãs, sem a adição de qualquer outro produto ou refino, com acidez máxima de 0,8% e sem defeitos sensoriais.

– Azeite virgem

Obtido de azeitonas sãs, também sem a adição de qualquer outro produto ou refino, com grau de acidez entre 0,8% e 2%. Nesta classe são tolerados pequenos defeitos sensoriais.

– Azeite lampante

Gordura obtida de azeitonas sãs, sem adição de qualquer outro produto ou refino, com acidez superior a 2% e defeitos sensoriais. É vendido para fins industriais. O nome lampante está ligado a lamparina, a um óleo usado para a iluminação. É impróprio para o consumo humano. Para isso, precisa ser refinado.

– Azeite refinado

Azeite extravirgem, o topo da classificação gastronômica. Steve Buissinne / Pixabay

É um óleo purificado no processo de refinação, através de produtos químicos ou destilação. As azeitonas para produzir esse óleo podem conter danos mecânicos ou algum tipo de problema capaz de ser suprimido na refinação. O processo tira a acidez excessiva, a cor, o aroma e o sabor. Ele é comercializado através da adição de azeite extravirgem ou virgem, que lhe atribui propriedades aromáticas e gustativas.

– Azeite puro

É o óleo obtido pela mistura de azeite refinado com azeite virgem. A denominação, na embalagem, pode ser de azeite puro ou simplesmente azeite. A acidez permitida é de até 1%.

– Óleo do bagaço da azeitona

Óleo retirado do bagaço bruto da azeitona utilizada para produzir azeite de oliva. Vendidos para a indústria, entre elas a farmacêutica e de cosméticos. Não pode ser chamado de azeite. É um produto que preserva parte dos polifenóis e propriedades do azeite. Para o consumo humano precisa ser refinado.

– Óleo de bagaço de azeitona refinado

Óleo retirado do bagaço da azeitona que foi refinado para o consumo humano. Não deve ser consumido cru. É ideal para o uso em frituras. Isso porque o ponto de saturação está acima dos 200º C. Isso faz com que não degrade em altas temperaturas.

O azeite na culinária

O azeite de oliva pode ser usado de diversas maneiras na culinária. Para conservar, cozinhar, temperar. Os usos podem variar de acordo com o tipo de azeite.

Se for comprar um azeite para cozinhar, o virgem ou puro fazem um bom trabalho. Isso porque, ao ser aquecido, o azeite perde suas qualidades naturais. Sendo assim, melhor usar um azeite mais simples para a panela, que tem preço mais em conta. Se for fritar, o óleo de bagaço de azeitona, chamado de olio di sansa di oliva na Itália, é uma boa opção.

Para temperar, o azeite de oliva extravirgem é o melhor. Ele está no topo da pirâmide de qualidade do produto. E, cru, sem aquecimento, irá agregar um sabor adicional ao prato. Para isso, deve ser adicionado à mesa ou na finalização do preparo, fora do fogo, para que suas características aromáticas e gustativas sejam percebidas.

A compra

A primeira coisa que muita gente olha quando vai comprar um azeite extravirgem é a acidez. Sem dúvida, ela é um dos fatores de qualidade do produto. A baixa acidez revela eficiência no processo de colheita e processamento das azeitonas.

Mas trata-se de uma leitura laboratorial, que mede a proporção de ácidos graxos livres em relação ao ácido graxo oleico, este último monoinsaturado, com propriedades cardioprotetoras. Essa acidez imperceptível ao paladar, não aparece na boca. É uma leitura de processo. Azeites extravirgens com acidez até 0,8% estão dentro do padrão de qualidade do produto.

A data de produção do azeite é um fator de grande importância, que deve ser levada em consideração na hora da compra. Quanto mais novo o produto, melhor. O azeite estará mais fresco e revelará ao olfato e paladar suas melhores características olfato-gustativas. Além disso, estarão mantidos todos os benefícios nutricionais do produto. E o risco de alguns possíveis defeitos, como o ranço, por exemplo, podem ser descartados.

Os estilos

Azeitonas no tanque

Do frutado verde ao maduro, os azeites de oliva diferem uns dos outros por detalhes aromáticos e gustativos trazidos pelo tipo da azeitona, pelo terroir em que as oliveiras frutificam, pelo ponto de colheita dos frutos e o tipo de extração. O amargo e o picante são características de gosto e tato importantes nos azeites.

Eles estão diretamente ligados à qualidade dos óleos. O picante e o amargo podem ter maior ou menor intensidade, dependendo do ponto de colheita das azeitonas. Quanto mais verde for colhida a azeitona, mais acentuados serão o amargor e a picância, que vêm dos polifenóis presentes nos frutos.

Azeites com aromas herbáceos mais evidentes são elaborados com azeitonas colhidas mais verdes. Azeites com um frutado maduro, fruto de azeitonas igualmente maduras.

Azeite à mesa

Na hora de combinar o azeite com alimentos, há algumas dicas. Azeites herbáceos, intensos e com amargor típico, combinam com preparos condimentados e de sabores intensos. Os azeites frutados e herbáceos vão bem com saladas e carnes suaves. Azeites picantes combinam com mariscos e queijos intensos. Azeites maduros, suaves, são perfeitos para acompanhar pescados e carnes brancas.

Os aromas dos óleos de oliva podem variar de acordo com a variedade da azeitona e a região produtora. Notas herbáceas, de folhas amassadas, chá verde, tomate e banana verdes costumam aparecer em azeites mais frescos. Notas de frutas como a maçã, a banana madura, tomate maduro e amêndoas podem ser notados em azeites elaborados com azeitonas mais maduras.

* João Alexandre é jornalista, cozinheiro e sommelier. @joao.lombardo

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