Após interferir na política interna de outros países de forma virtual por meio de seus hackers, a Rússia de Vladimir Putin planeja criar uma rede própria da internet. Os russos a chamam de “internet soberana”.
Com uma rede própria, o país poderá se desconectar do sistema global sem que sua rede interna da web pare de funcionar por causa de alguma interferência externa. Um projeto de lei foi apresentado no ano passado e passou no parlamento russo na última terça-feira (13). O custo será em torno de US$ 300 milhões. Especula-se que em abril o governo faça um teste para avaliar a eficácia do sistema, que envolve muitas questões técnicas.
O outro objetivo do projeto é o aumento do controle do governo sobre tudo que passa pela rede global. As autoridades vêm apertando o cerco à internet há vários anos. Páginas da web ligadas à diminuta oposição e que são críticas ao governo são bloqueadas, bem como algumas redes sociais, como o aplicativo de mensagem Telegram e o Linkedin.
Outros países, autocráticos e mesmo democráticos, já adotaram essa iniciativa há muito tempo. A China estabeleceu seu controle assim que a internet se tornou inevitável.
Um sofisticado e complexo sistema de checagem do que está saindo na web está configurado para detectar o que pode ou não pode ser acessado pelos seus cidadãos. Os chineses também desencorajaram sites de pesquisa e todas as redes sociais a se estabelecerem no país.
Para evitar problemas com a população, ávidas como todo o mundo por esses serviços, estimularam “empresários” locais a criarem sites e redes sociais alternativas. O Baidú é uma cópia do Google, mas com todos os filtros para evitar a “contaminação” ocidental.
Os russos têm razão em se preocupar. Eles mesmo começaram essa “guerra fria” na web global ao interferirem na última eleição presidencial norte-americana, em que o republicano Donald Trump venceu a democrata Hilary Clinton.
E-mails da campanha de Clinton foram vazados por hackers russos, bem como milhares de mensagens via redes sociais contra a democrata. Serviços de espionagens americanos e europeus detectaram a interferência e o FBI está investigando a participação da campanha de Trump em toda a trama.
Além da eleição de Trump, já se sabe que o mesmo se deu no Brexit, no plebiscito catalão que declarou a independência catalã. Nas últimas eleições francesas os russos atuaram em favor de Marine Le Pen, amiga de Putin, para citar apenas alguns exemplos. A Aliança Militar do Ocidente (Otan) ameaça punir a Rússia por esses ataques cibernéticos. A tal “internet soberana” será uma maneira de evitar uma resposta ocidental na mesma moeda.
* Luís Eduardo Akerman é jornalista e analista de política exterior. Ex-editor de Internacional do Jornal de Brasília.