Os juros podem voltar a cair, mas não é isto que vai destravar a economia

São muitas as disfunções da economia, elencadas ao longo do artigo. Porém, pouco pode-se esperar do Governo Bolsonaro para destravar a economia, que, talvez, precise esperar o próximo presidente para desatar as amarras que impedem nosso crescimento econômico. Até lá, será o arroz com feijão

Sede do Banco Central, em Brasília - Foto: Orlando Brito

A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (COPOM) deixou uma janela aberta para uma pequena redução nas atuais taxas de juros de 2%, caso uma segunda onda da covid-19 venha travar de vez a economia.

Na hipótese de ser adotada é uma medida que pode trazer impactos sobre os ganhos dos intermediadores do mercado financeiro e do Tesouro Nacional, mas seus efeitos de estímulo à economia real serão mínimos.

Economista John Maynard Keynes

É que diante de juros nominais próximos a zero, a política monetária torna-se vítima da armadilha de liquidez, conceito formulado pela primeira vez pelo economista britânico John Maynard Keynes. Quando isso ocorre, juros muito baixos e outras medidas de política monetária de injetar mais recursos na economia não conseguem os resultados esperados de estimular o crescimento econômico.

Os ganhadores ou perdedores potenciais de uma futura queda de juros são os banqueiros que vivem o dia a dia comprando e vendendo papéis do Tesouro Nacional no mercado. O governo se beneficia da queda dos juros na rolagem de seus papéis.

O Banco Central informou que nos últimos 12 meses, os juros nominais atingiram R$ 335,7 bilhões (4,65% do PIB), comparativamente a R$ 360,0 bilhões (5,03% do PIB) no acumulado até setembro do ano anterior. O Tesouro Nacional conseguiu fazer uma economia de R$ 25 bilhões, quase uma bolsa família de um ano.

Mesmo assim, diante da atual crise fiscal da União, é um valor insignificante, pois de janeiro a setembro de 2020 o déficit primário consolidado do setor público atingiu R$ 635,9 bilhões, em grande parte pela ajuda injeção de recursos no combate aos efeitos da covid-19.

O ministro Paulo Guedes, da Economia – Foto: Orlando Brito

O ajuste fiscal defendido pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes, como condição para atrair investidores estrangeiros e nacionais, foi pro brejo de vez. Guedes não conseguiu levar adiante suas ideias de ajuste nestes primeiros anos de governo Bolsonaro e não será nos últimos dois que irá fazer. As propostas de ajuste que estão no Congresso, assim como a reforma tributária, serão levadas de acordo com os interesses dos parlamentares, que sempre colocam em primeiro lugar o interesse de seus eleitores. Guedes passou a brigar publicamente com seu colega Rogério Marinho e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que em tese defendem o ajuste fiscal como visão estratégica de credores do Tesouro Nacional. A viúva precisa ter solvência para que possam receber seus créditos.

Esta dúvida sobre a saúde financeira do Tesouro Nacional tem impactos sobre a decisão do investidor, mesmo com a queda das taxas de juros. O desemprego de cerca de 14 milhões de brasileiros, mesmo com a notícia de criação de 313 mil vagas no último mês de setembro, é de grande valia, mas em nada muda o triste cenário de desemprego e renda dos brasileiros, mesmo com as atuais medidas monetárias de estímulo a economia adotadas pelo BC.

Os juros baixos, na realidade, estão contribuindo para manter por mais tempo o real desvalorizado diante do dólar em um patamar nunca visto antes. O investidor estrangeiro e mesmo os brasileiros estão enviando seus recursos ao exterior onde a remuneração é quase igual a que tem no Brasil sem os riscos, o que contribuiu também por uma procura maior de dólar no mercado.

Os ganhadores desta desvalorização da moeda são os exportadores em geral e o setor agrícola. Os preços recordes de uma saca de soja a R$ 155,00 no mercado do Rio Grande do Sul e do milho a R$ 68,00 na última semana estão enchendo o bolso dos agricultores. O impacto dos produtos agrícolas deverá ocorrer nos preços de carnes e derivados de soja. É uma pressão inflacionária que deverá fazer parte da vida dos brasileiros com poder de compra. Os desamparados terão que contar com ajuda do governo para não passar fome.

Ministro Paulo Guedes, presidente Jair Bolsonaro e o titular do Banco Central, Roberto Campos Neto – Foto: Orlando Brito

A atual equipe de Paulo Guedes e Roberto Campos Neto estão com muito pouco espaço para fazer diferente do que estão realizando para estimular a economia. Viveremos tempos que lembram a política econômica dos últimos anos do governo do presidente José Sarney, que foi alcunhada de feijão com arroz: fazer o básico até que um novo presidente seja eleito para fazer o ajuste fiscal e uma política monetária que possa colocar o País em rota de crescimento, condição fundamental para gerar riqueza e reduzir o desemprego e a pobreza.

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