Extremismo, a doença infantil da diplomacia

O encontro de Bolsonaro e Trump vai expor a direção da política exterior brasileira. Se engajada ou pragmática, por ora os sinais que se vê é a troca do extremismo de esquerda pelo de direita.

Bolsonaro e Araújo/Foto Orlando Brito

O encontro do presidente Jair Bolsonaro com seu homólogo americano Donald Trump nesta terça-feira (19), na Casa Branca, dará uma dimensão exata para onde caminhará a política externa do Brasil nos próximos anos. Uma mudança de eixo de 360º na atuação do Itamaraty na era petista, comandada pelo trio Marco Aurélio Garcia, Monica Valente e o embaixador Celso Amorim.

Sai a esquerda e o engajamento Sul/Sul, e entra a extrema-direita, baseada nos “princípios” trumpista, de isolacionismo, valores cristãos e família. O chanceler Ernesto Araújo, que outrora era um apoiador da política externa do PT, é ele mesmo um “cristão novo” dessa política. Para Araújo, Donald Trump vai salvar o Ocidente da decadência.

Donald Trump/Photo by Shealah Crajghead/White House

Em aula magna na segunda-feira (11) o novo ministro defendeu o rompimento com a política exterior que, segundo ele,  vem desde o início dos anos 1950 – com um intervalo dos anos petistas – na qual, o pragmatismo e o não alinhamento automático do Brasil faziam parte de uma política de Estado. Inclusive durante o regime militar, da qual o presidente é caudatário.

O chanceler, discípulo do guru, ex-astrólogo e escritor, Olavo Carvalho – a quem deve sua indicação ao Itamaraty -, afirma que o Brasil quer vender soja, minério de ferro, mas não pode vender sua alma, em uma referência à China.

Ele se faz de desentendido, ou parece que viveu em Marte nos últimos 16 anos. A China é, há mais de uma década, a maior importadora de commodities agrícolas e minerais do Brasil.

Os chineses estão para fazer um acordo comercial com os americanos para aplacar a fúria protecionista de Trump. Na pauta, os chineses deverão importar a soja americana no valor de US$ 30 bilhões.

E agora, chanceler? O senhor combinou com os produtores brasileiros e os Ministérios da Economia e da Agricultura essa troca de relações preferenciais?

Essa turma (a expressão é essa mesma) acredita que o gigante asiático ainda é comunista. Aqui eles combinam com sua nêmese. A esquerda classifica de “socialismo com características chinesas”, ou “socialismo de mercado”, o regime político e econômico da China. Tudo conversa fiada.

É capitalismo mesmo – com seus bilionários, e consumismo desenfreado e suas mazelas sociais. Igual ao Ocidente. De socialismo mesmo só o governo de partido único. Um modo de governar em que os dois lados concordam, embora se fale de democracia a todo instante.

Ministros Sergio Moro e Paulo Guedes. Foto Orlando Brito

Além de Araújo, acompanharão o presidente, os ministros da Justiça, Sérgio Moro; da Economia, Paulo Guedes; da Agricultura, Tereza Cristina; da Segurança Institucional, Augusto Heleno. Para coroar a comitiva, o deputado Eduardo Bolsonaro, eleito na semana que passou presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara. Ele é também um entusiasta de Trump e do Olavo de Carvalho.

Está prevista na agenda do presidente Bolsonaro encontros com Olavo de Carvalho, Steve Bannon – olha que perigo! – e grupos religiosos evangélicos, que lá, como aqui, têm muita influência no governo, embora não se veja nenhum dos dois presidentes em templos cristãos, católicos ou evangélicos aos domingos participando de missas e cultos. O uso da religião e de valores morais é um clássico do populismo de direita em todo o mundo.

* Luís Eduardo Akerman é jornalista e analista de política exterior. Ex-editor de Internacional do Jornal de Brasília.

Deixe seu comentário