Quem conhece minimamente o Congresso Nacional sabe que, faltando exatamente quatro semanas para o encerramento dos trabalhos legislativos – na prática cerca de oito dias úteis de votação -, nenhuma matéria polêmica entrará na pauta nem no plenário da Câmara nem do Senado este ano. No máximo, os senadores vão concluir o segundo turno da PEC 133/19, a chamada PEC paralela da Previdência, e só. O resto fica para 2020 ou para as calendas gregas.
Aliás, deixar para as calendas os projetos e PECs que autorizam a prisão em segunda instância, em tramitação nas duas Casas, é o que pretendem os presidentes da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre. Desculpas não vão faltar. Afinal, o governo se encarregou de encher a pauta enviando para o Senado três PECs com mudanças no pacto federativo e para a Câmara a privatização da Eletrobras e a reforma administrativa. Isso sem falar na reforma tributária, que foi deixada de lado depois de mobilizar muitas discussões, mas será retomada ano que vem.
Com tantas prioridades, certamente a prisão em segunda instância – assunto que pouco interessa a muitos parlamentares, a começar pelos presidentes das duas casas – vai ficando para o fim da fila. Como 2020 é ano eleitoral, o segundo semestre será pouco movimentado e, mais uma vez, pautas polêmicas ficarão de fora.
Alcolumbre já deixou claro que não quer nem ouvir falar em prisão em segunda instância. Ele ironizou a cobrança dos senadores para que as propostas que mudavam o novo entendimento do Supremo avançassem. “A gente podia fazer uma nova Constituinte. Todo mundo renunciava aos mandatos e a gente fazia uma nova Constituinte”. A má repercussão da fala fez o presidente do Senado recuar e até acertar com Simone Tebet, presidente da CCJ da Casa, pautar em plenário a PEC 5/19, do senador Oriovisto Guimarães.
A PEC 5/19 insere o inciso XVI ao artigo 93 da Constituição Federal, que trata do Pode Judiciário, para positivar a possibilidade de execução provisória da pena após a condenação por órgão colegiado. Ela já está na pauta da Comissão de Justiça do Senado da próxima quarta-feira. O autor da proposta acredita que, se aprovada, resolveria de vez a insegurança jurídica provocada pelas idas e vindas de posicionamento dos integrantes do Supremo.
Mas não será tão fácil assim. Embora o parecer da Juíza Selma seja favorável, a PEC deve passar por um pedido de vista, excluindo qualquer possibilidade de vir a ser incluída no plenário ainda este ano. Ou seja, com muito boa vontade a proposta consegue, no máximo, ser aprovada na Comissão de Justiça.
Na Câmara a situação é ainda pior. A resistência de deputados contrários à mudança do novo entendimento do Supremo já dificultou muito o andamento da PEC 410/18, do deputado Alex Manente, pautada na CCJ desde meados de outubro. Foram tantos os recursos protelatórios e intervenções barulhentas, que não foi possível avançar na discussão da proposta.
A grande preocupação dos dois lados é que ninguém sabe ao certo quantos parlamentares realmente votarão a favor prisão em segunda instância, ou quantos estão apenas jogando para a plateia. Não dá para fazer uma contagem por bancada, como normalmente acontece com as votações da maioria das propostas, porque simplesmente – por causa do apoio popular – há defensores em quase todos os partidos nas duas casas.
As únicas bancadas que são inteiramente contrárias à aprovação da prisão em segunda instância – por motivos óbvios, claro – são as do PT, PCdoB e Psol. Graças à mudança de entendimento do STF, o ex-presidente Lula está livre, leve e solto.
Um mapa organizado pelo Movimento Vem Pra Rua indica que a maioria do Congresso é favorável à prisão em segunda instância. São 254 deputados e 47 senadores a favor dos textos que estão sendo discutidos nas duas casas. Número insuficiente para a aprovação de emenda constitucional. Neste caso são necessários os votos de 2/3 do Congresso em dois turnos de votação em cada casa, ou seja, 49 senadores e 308 deputados.
A solução mais fácil para os que defendem a prisão em segunda instância seria aproveitar a deixa do voto do ministro Dias Toffoli e aprovar uma alteração no Código Penal. A tramitação é mais rápida não há necessidade de um quorum tão alto para aprovação. Propostas existem, o problema é que nenhuma saiu da gaveta e nem vai sair agora. Ou seja, a discussão continua ano que vem, mas só Deus sabe quando será encerrada, ou se será encerrada.