Liberou geral das armas não consegue unir sequer os senadores militares

Para o Capitão Styvenson, estão transferindo obrigação da segurança pública do estado para o cidadão.

O senador Capitão Styvenson Valentim - Foto Orlando Brito

Conhecido pela rigidez com que atuava na coordenação das blitzes da Lei Seca no Rio Grande do Norte, o capitão da Polícia Militar Styvenson Valentin foi eleito senador pela Rede em 2018 derrotando nomes tradicionais da política estadual como o ex-senador e ex-ministro Garibaldi Alves Filho.

Atualmente no Podemos, Capitão Styvenson, como é chamado, não concorda com o decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro, no último dia 7, flexibilizando as regras para o porte de arma. “O decreto transfere para o cidadão a autodefesa e a obrigação de se proteger e fazer segurança pública”. Opinião diferente do colega Major Olímpio, ex-oficial da PM de São Paulo, favorável à proposta.

Em entrevista exclusiva a Os Divergentes, ele fala também sobre os pedidos de CPIs da Lava Toga, para investigar os tribunais superiores; e da Anistia, que pretende investigar o pagamento de indenizações aos anistiados políticos, da qual é o autor.

O requerimento da CPI da Lava Toga foi rejeitado pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, mas aguarda a votação, pelo plenário, do parecer da Comissão de Justiça, que considera o pedido inconstitucional. Já a CPI da Anistia ainda aguarda manifestação da Mesa.

Para o Capitão Styvenson, “as duas CPIs só serão instaladas quando a população for para frente do Senado cobrar. O povo virá”. A seguir, a íntegra da entrevista:

 

Os Divergentes – Quais os pontos positivos e negativos do Decreto que altera as regras para o porte de armas assinado pelo presidente Bolsonaro?

Cap. Styvenson – O decreto, na amplitude dele, eu vejo como um perigo porque transfere para o cidadão a autodefesa e a obrigação de se proteger e fazer segurança pública. Não é assim. Segurança pública é dever do estado, é dever do município, é dever dos governos. Se meu estado, o Rio Grande do Norte, está com deficiência de efetivo e atraso de pagamento, que o governo federal chegue com recursos, auxilie. Nós temos hoje efetivo defasado, viaturas velhas, policiamento totalmente despreparado, destreinado, armamento totalmente obsoleto, coletes inválidos e pouca munição, pouca munição. Policial tem que contar quantas munições ele tem.

Não sou contra dar o direito individual às pessoas [de possuir armas], mas sou a favor de critérios fortes, objetivos e infalíveis para o porte, como o exame toxicológico, avaliação periódica e punição. Tirar o porte de arma por qualquer motivo.  Mostrou a arma em público, exibiu arma, agrediu alguém, ameaçou alguém, perde o porte. Como policial, aprendi que arma não se mostra. Arma não se tira do coldre se não for pra ser usada. Então fico vendo essa sociedade que tem essa ânsia de mostrar o que tem.  Discutiu no transito, perde. Cortou o sinal de transito, perde. Pra usar uma arma tem que ser perfeito.

Os Divergentes – O Brasil tem mais de 60 mil homicídios por ano, um número muito maior do que em países que vivem em guerra. Como sua experiência enquanto policial, a liberação das armas pode aumentar esse número?

Cap. Styvenson – Se tem mais armas disponíveis a probabilidade pode aumentar. Estou usando aqui uma probabilidade. Se tivermos 20 milhões de pessoas que poderão ter armas com a quantidade de munição que vai ter. Não que essas pessoas vão cometer os assassinatos,  mas pode ser que elas percam essas armas para os bandidos, os bandidos vão querer tomar essas armas. Vai ter mais armas circulando. Pode ser que esse número aumente sim.

Os Divergentes – O estado teria como fazer esse controle?

Destruição de armas na Vila Militar do Rio. Foto Tânia Rêgo/Agência Brasil

Cap. Styvenson – Não tem porque não quer. Com a tecnologia que existe hoje não faz porque não quer. Na palma da minha mão posso controlar tudo. Tem aplicativo pra tudo. Tem interação de sistema pra tudo: sistema de multa, sistema de ocorrência, sistema de hospitais. Todos os sistemas hoje podem ser interligados. Agora, a gente falha como organização, com estatística e a bio obtenção de dados. Por isso que o estado não consegue fazer essa fiscalização. Recentemente vi na palma da minha mão um aplicativo trabalhista mostrando o custo dos acidentes de trabalho pra Previdência, que de 2013 a 2018 chegou a R$ 83 bilhões. Informação tem, não tem unificação.

Os Divergentes – O Senado aprovou um projeto que vai rastrear os projéteis.

Cap. Styvenson – Apresentei recentemente o PL 603/2019, que rastreia o projétil, dá um DNA ao projétil. 90 por cento dos casos de homicídios causados por armas de fogo não são solucionados por quê? Porque não tem a arma de fogo. Tem que fazer balística, tem que fazer um aparato caríssimo no IML para descobrir de quem é a arma e nunca se chega [ao responsável]. Então, rastrear a munição, dar uma identidade à munição, dizendo quem comprou e como vai usar, evitaria bala perdida. Isso daria uma linha inicial de investigação, saberia de quem veio à munição.

Os Divergentes –Mas as corporações vão aceitar?

Armas apreendidas. Foto Polícia Federal

Cap. Styvenson – Não é querer, é obedecer. Tem que seguir a regra. Militar não tem querer não, obedece, como eu obedeci a vida toda. Se eu quero parar, quero sanear, quero investigar e não tenho uma linha inicial de investigação, como eu começo isso? Pelo projétil. É ele que fica dentro do corpo da pessoa. Vai ser caro? Cara é a quantidade de homicídios que a gente tem hoje. Cara é a violência que a gente tá enfrentando.

Os DivergentesO Decreto parece que não teve a concordância de muitos, tanto que estão falando em inconstitucionalidade.

Cap. Styvenson – Creio que seja [o decreto] inconstitucional. O fato de liberar da forma como foi liberado, causou espanto. O que se tinha pelo estatuto do desarmamento: a possibilidade de ter uma arma obedecendo a critérios. Agora os critérios são por profissão. O que gente vai ver é uma explosão de gente armada. Todos que querem uma arma vão buscar esse caminho, pela profissão, que é o caminho mais fácil. O cidadão precisa ter defesa, precisa ter segurança, quem tem que dar segurança é o estado, com policiamento nas ruas. Sabe por que explodem bancos no interior? Porque não tem policial.

Os Divergentes – Um dos pontos do decreto, que inclusive já foi falado aqui no Senado, é a possibilidade de permitir ao cidadão entrar armado nos aviões. Não é uma norma contrária às regras mundiais? Não estamos negligenciando a segurança nos aeroportos?

 Cap. Styvenson – Em relação aos aeroportos é uma contramão que a gente está entrando. Não sei quem vai entrar no avião. Se a pessoa tem um surto psiquiátrico com arma na mão pra onde eu corro, pro banheiro? Pra cabine que está fechada? Quantos casos nós já vimos causados por pessoas que tiveram um surto e a gente não entende o motivo de ter acontecido aquilo. A pessoa que acho que tem mais capacidade na terra [de usar arma] seria o padre e ele não quer.

Os Divergentes – outra proposta polêmica do governo é com relação ao trânsito. O presidente quer aumentar o número de pontos na carteira e reduzir o número de radares. Como policial qual sua percepção?

Cap. Styvenson – Quando eu falo as pessoas pensam que sou contra o governo Bolsonaro. Não sou não. Não precisei dele pra ganhar a eleição, não precisei do nome dele, nem do PSL, nem de partido político. Por isso não preciso ficar aqui bajulando ninguém. Pra mim o problema do trânsito é a má educação. Tem um período curto para tirar a habilitação. Educação de trânsito tem que ser dada nas escolas, para as criança. As pessoas estão aterrorizadas com os homicídios, com a violência, mas ninguém se aterroriza com o trânsito. Mata muito mais. E deixa muito mais sequelas quando sobrevive. Sobrecarrega o SUS, os hospitais.

Os Divergentes – O Sr apresentou uma CPI para investigar os benefícios pagos aos anistiados políticos. Como anda essa CPI, foi engavetada?

Cap. Styvenson – Estou há três meses no Senado. Nunca fui político, nunca fui vereador. Nunca fui nada. Eu era avesso à política. Agora eu entendo como as coisas funcionam. Em três meses que eu estou aqui dentro eu entendo a diferença entre politicagem e política. A diferença de privilégios, benefícios próprios e benefícios à população. Comigo a jogada pode ser diferente. Como está minha CPI? Como está o pedido? Aguardando o quê? A sequência de quê? A ordem de quem? A vontade de quem?  Não sei. Infelizmente eu preferia ser ignorante como era antes, preferia não conhecer. A gente vai vendo e vai ficando cada vez mais decepcionado.

As CPIs da Lava Toga e da Anistia querem procurar a verdade. A gente não quer confrontar ninguém, não quer rechaçar ninguém. A gente busca a verdade. E qual é o medo da verdade? Essas CPIs vão sair quando a população vier aqui pra frente do Congresso cobrar, nós estaremos aqui para garantir que não haja violência, mas o povo virá.

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