O BC (Banco Central) deverá promover uma nova rodada de queda das taxas de juros para se ajustar a uma inflação menor, fruto de um encolhimento no Produto Interno Bruto (PIB), mesmo sabendo que a medida é insuficiente para evitar a recessão que vem pela frente. O Banco Mundial está estimando uma queda de 5% no do PIB do Brasil para 2020.
Na última semana, o atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, manifestou uma opinião divergente do ex-presidente da instituição, Henrique Meirelles, sobre a intensidade da queda dos da taxa selic. De fato, uma nova queda mais acentuada de juros deixará a taxa selic praticamente equivalente à inflação e, neste caso, seus efeitos monetários para estimular o crescimento serão praticamente nulos, como definiu o economista John Maynard Keynes no seu estudo sobre a “armadilha da liquidez”.
Com indicadores de aumento de desemprego, perda de renda dos brasileiros em isolamento social pelo coronavírus e queda da atividade econômica, haverá redução dos preços. O enfraquecimento da economia e a queda do poder de compra apontam para uma inflação menor. Um cenário futuro com as atuais taxas nominais de juros de 3,75% e inflação menor implicaria juros reais maiores, desestimulando ainda mais o consumo e a atividade produtiva.
A autoridade monetária está seguindo as normas e protocolos dos Bancos Centrais do resto do mundo para enfrentar a crise de liquidez no sistema financeiro, com injeção de recursos e redução dos juros básicos. A eficácia da queda das taxas de juros utilizada antes da crise do coronavírus teve pouco impacto sobre a retomada do crescimento, como foi observado ao longo do ano de 2019, em função da perda de emprego, renda e investimentos públicos e privados.
Diante da magnitude da atual crise de liquidez uma queda da taxa selic daria pouca contribuição para a expansão da demanda agregada da economia. O maior beneficiado, na verdade, seria o Tesouro Nacional, que teria uma redução de custos de emissão ou rolagem da sua dívida pública.
Com as medidas de injeção de dinheiro na economia com pagamento do auxílio de R$ 600 para cerca de 30 milhões de brasileiros, sem falar na liberação dos recursos do FGTS e linhas de crédito, haverá uma expansão dos maios de pagamentos, especial o M1, papel moeda em poder do público, e depósitos a vista. No entanto,ainda não há dados sobre o impacto destes recursos sobre o consumo das famílias. O certo é que uma maior oferta de moeda em uma situação em que os juros nominais estão muito próximos aos números de inflação contribuem muito pouco, como já previa Keynes, para estimular a atividade econômica.
Diz Keynes: “A medida que a taxa de juros cai para zero, a demanda torna-se horizontal. Isso implica que quando a taxa de juros é igual a zero, aumentos adicionais de oferta de moeda não produzem efeito sobre a taxa nominal de juros”.
Roberto Campos Neto chegou a dizer que não é com emissão de papel moeda que a economia vai se recuperar. Ele sabe que juros nulos ou até negativos tem baixa potencialidade na política monetária.
A recuperação da economia vai depender da conquista de um equilíbrio fiscal e de investimentos públicos e privados em infraestrutura e setor produtivo. O reequilíbrio fiscal deverá ser buscado pelo governo com corte de gastos obrigatórios, receitas de privatizações e aumento de impostos sobre patrimônio.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, verbalizou a alguns senadores a possibilidade de usar parte das reservas internacionais, que hoje estão na casa dos US$ 360 bilhões, para cobrir as despesas que está fazendo para enfrentar o coronavírus.
A ideia de reservas não é nova. Há de um ano em um seminário da Instituição Fiscal Independente (IFI), ligado ao Senado Federal, a economista Monica de Bolle, defendeu a utilização de um terço das reservas do Brasil para que seus recursos em reais fossem investidos em obras públicas. Monica de Bolle informou na época que o montante de reservas que poderiam ser utilizadas, sem que isso criasse algum risco soberano ao Brasil, foi definido em estudo por técnicos do Fundo Monetário Internacional.
De fato, se Paulo Guedes levar adiante sua intenção, utilizando por hipótese cerca de U$ 100 bilhões da reservas do Brasil, poderia cobrir a maior parte das despesas projetadas pelo governo, pois estes valores serão da ordem de R$ 520 bilhões. O Brasil continuaria com mais de US$ 200 bilhões de reservas para fazer frente a seus compromissos externos e enfrentar os ataques especulativos de câmbio.
Alguns economistas têm criticado a manutenção das reservas ao longo das últimas décadas com custos elevados ao Tesouro Nacional. A realidade é que estas reservas foram constituídas para o Brasil enfrentar momentos de crise financeiras internacionais como esta em estamos vivendo.
Se não forem utilizados neste momentos, o Tesouro Nacional ficará apenas com o ônus de seus custos sem qualquer benefício no atual momento. Um dos benefícios seria trocar estes dólares no mercado neste momento a um preço que em muitos casos deve ser o dobro de quando foram comprados.
A operação de venda dos dólares faria com que um valor equivalente em reais deixaria de circular na economia, tendo em vista que iria para o governo. A autoridade monetária ficaria com as mãos livres para administrar com maior eficiência a quantidade de dinheiro em circulação na economia.
A utilização destes recursos de reservas para cobrir as despesas com o coronavírus, grande parte do déficit primário das contas públicas estimado em 4% do Produto Interno Bruto (PIB) para 2020, seriam resolvidos. O reequilíbrio fiscal abriria espaços para novos programas de investimentos públicos, sem falar nos benefícios na condução da sua política monetária.