O Brasil tem, obviamente, em sua história vários momentos que marcaram profundamente o destino seu destino. Inúmeros, muitos. Dois deles, porém, merecem atenção porque têm sentido completamente opostos. O primeiro é o famoso “Dia do Fico”. O segundo, o “Dia do Saio”. Um, por forças explícitas. Outro, por forças ocultas. Ambos protagonizados por homens que governaram a nação.
O primeiro se deu em 9 de janeiro de 1822, portanto há precisamente 200 anos. Dom Pedro I, nosso então Príncipe Regente, era pressionado a retornar a Portugal. O jovem monarca havia herdado a coroa do pai, Dom João VI, que embarcara nas esquadra de caravelas de volta ao Palácio de Queluz após 13 anos fora de seu país devido à invasão das tropas de Napoleão.
Pedro era um menino de 9 anos quando desembarcou do navio Príncipe Real, a Nau Capitânia, no Rio de Janeiro, em março de 1808. Com a desocupação francesa de Portugal, seu pai Dom João VI, sua mãe Dona Carlota Joaquina e seu irmão Miguel puderam voltar para casa, na até hoje agradável freguesia de Queluz, entre Sintra e Lisboa. Pedro de Alcântara Francisco Antônio João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon ficou no Brasil. Digamos, em linguagem popular, tomando conta do trono.
Mas no começo de janeiro de 1922, as Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa exigiram sua volta imediata a Lisboa. Queriam devolver o Brasil à condição de colônia. Em reação, forças organizadas do Rio de Janeiro e de outras regiões uniram-se e, entregaram uma lista com oito mil assinaturas populares, pedindo a Pedro I que aqui continuasse. E o jovem decidiu permanecer. Fez então o discurso da sacada do Paço Imperial lotado de brasileiros. Foi de lá, cercado pelos nobres da Corte e líderes interessados em manter suas posses que proferiu a frase que marcou não somente sua sua vida, mas também o destino do Brasil:
– Se é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou pronto. Digo ao povo que fico!
Estava, assim, aqui instalado o Segundo Reinado. Oito meses após essa decisão, declarou a Independência do Brasil, com o também heroico e histórico Grito do Ipiranga, em 22 de abril.
Depois, em 1831, nosso Dom Pedro I abdicou da coroa em favor do filho, Pedro II. Regressou a Portugal e lá tornou-se Dom Pedro IV, ao destronar Dom Miguel, seu irmão que assumira o trono com a morte do pai João VI. Bem, mas isto é outra história.
A segunda data se refere não ao Império, mas à República. E aconteceu 139 anos depois do “Dia do Fico”. Falo do “Dia do Saio”, ou seja da renúncia do então presidente Jânio Quadros, eleito para suceder Juscelino Kubitschek, em 1959. Nasceu em Mato Grosso, criou-se em Curitiba. Mudou-se para São Paulo, elegeu-se vereador, deputado, prefeito e governador do estado. Era professor e advogado. Brilhante orador, até mereceu a Medalha da Ordem do Cristo, de Portugal.
Jânio era tido como homem polêmico. Proibiu as mulheres de usarem biquíni nas praias, a transmissão pelas rádios dos concursos de miss. Mas foi em seu breve governo que criadas, por exemplo, as reservas ecológicas, o Parque Indígena do Xingu. Tinha fama de temperamento difícil, repentino, surpreendente. Ainda assim, causou surpresa sua renúncia, em 25 de agosto de 1961. Não foi num 22 de março, mas seu gesto — contrário de Pedro I — resta até hoje conhecido como o “Dia do Saio”. Não se sabe até hoje as verdadeiras razões que o levaram a tão definitivo ato. Em sua carta de abdicação à Presidência, declarou:
– Forças terríveis levantam-se contra mim, e me intrigam ou infamam… Fui vencido pela reação e, assim, deixo o Governo!
Jânio faleceu em 1992 e até hoje não se sabe ao certo o por quê de sua renúncia, o “Dia do Saio”. Sua saída teve graves consequências. Em seu lugar, assumiu o vice João Goulart. Jango governava o Brasil há dois anos e meio quando sofreu o Golpe de 1964. Os militares permaneceram no Palácio do Planalto durante 24 anos.
Depois, em várias oportunidades, Jânio ensaiou voltar ao Poder. Elegeu-se prefeito de São Paulo em 1985, quando derrotou Fernando Henrique Cardoso. Bem, mas isto também é outra história.
Orlando Brito