Preste atenção nesse banquinho de madeira aí da foto, observado pelo menino à esquerda. Foi sentado nele que Che Guevara foi morto, há cinquenta anos na pequenina vila de La Higuera, na Bolívia. Nascido na Argentina, Che era médico e tinha 39 anos. Percorreu de motocicleta toda a América Latina até chegar a Cuba, onde juntou-se a Fidel Castro na luta contra o ditador Fulgêncio Batista. Tornou-se guerrilheiro e um dos ícones do Século XX.
O grupo liderado por Che Guevara foi cercado por um pelotão de 600 homens do Exército da Bolívia. A tropa de militares era comandada pelo capitão Gary Prado, treinado pela CIA – órgão de inteligência dos Estados Unidos – para combater a subversão na América Latina. Depois de duas horas de fogo pesado, restaram mortos “Miguel”, “Júlio”, “Coco Peredo”, companheiros de Che. Do batalhão, quatro soldados também morreram. Conta-se que dois bolivianos aliados de Guevara conseguiram desertar, no meio do tiroteio, correndo pelo desfiladeiro. Os demais foram presos.
Ferido na perna e impossibilitado de caminhar, Che foi levado nas costas pelo companheiro “Benigno” até La Higuera. Lá, um vilarejo de apenas 40 casas, o guerrilheiro argentino que virou o grande mito da juventude do Século XX, seria morto com seis tiros desferidos por um tenente bêbado, Mário Terán, em 9 de outubro de 1967. No dia seguinte, o corpo foi levado para Valle Grande e apresentado como troféu pelas autoridades numa lavanderia no quintal de um pequeno hospital.
Somente trinta anos depois, é que seu cadáver foi descoberto. Hoje, portanto, 50 anos atrás, Che Guevara, era morto. Estava sentado nesse banquinho de madeira ai da foto.
Como foi – Jamais imaginei que a foto de uma pedra, imóvel, fosse ter tanta significância. Depois de cinco dias embrenhados nos confins da Bolívia, tínhamos uma certeza: só mesmo um apego irrenunciável à ideologia – ou à loucura – podia levar àquele fim de mundo alguém que não fossem os pouquíssimos nativos da região.
Éramos dez, divididos em dois jipões Land Rover. Jornalistas, somente eu e Dorrit Harazin, a única mulher do grupo. Havia ainda um radialista holandês, um historiador belga e um pesquisador americano. Além de nós cinco, quatro guias bolivianos e um alemão, mateiros e chefe da viagem. Era 1997. Dorrit e eu estávamos fazendo uma matéria sobre os trinta anos da morte sem corpo do guerrilheiro amigo de Fidel Castro.
Após dez dias de viagem, percorrendo montanhas, cruzando rios e matas em estradas de terra do interior da Bolívia, chegamos ao fundo do Vale do Churro. Fizemos uma caminhada de duas horas para descer e outras três para subir, um cenário infernal. E eram somente dois quilômetros de onde deixamos os jipes.
Lampião chamaria de paraíso se o comparasse à caatinga do Nordeste brasileiro. Vegetação de garranchos e espinhos, terreno acidentado e sem caminhos. Impossível compreender como Guevara queria mudar o mundo a partir daquele deserto. Nem gente havia para aderir àquela revolução. Nem jovens, nem velhos. Nada mais além de ratões e cobras, meia dúzia de índios mascando folhas de coca e alguns urubus
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