Impressionante como o estilo de cada presidente é copiado em detalhes pelas pessoas que os admiram ou desejam agradá-los. Interessante como seus hábitos e costumes transformam-se em moda que muita gente adota e exerce religiosamente. E não é somente na maneira de dizer palavras. Mas também de copiar manias, a forma de vestir-se e utilizar as peças que usam.
Desde que tomou posse no Planalto, Jair Bolsonaro lançou a moda de nas cerimônias palacianas assinar decretos, projetos, programas de governo e fazer anotações com as canetas Bic. Acha que são sinônimo simplicidade. O gesto, considerado pelo pessoal do seu entorno como inovador e popular, passou imediatamente a ser imitado por número incontável de admiradores.
Onde quer que você vá, seja no palácio, nos ministérios ou Congresso, encontrará gente usando essas canetinhas esferográficas de preço baixo. Claro, principalmente o pessoal de primeiro escalão. Copiar o que faz um presidente virou hábito, que muita gente nem se incomoda em ser acusada de fazê-lo por explícita bajulação. E olha que não são somente governistas, mas também da oposição, coincidência ou não.
Bom lembrar que no Brasil essa onda de copiar os costumes dos mandatários remonta à época do Império. As caravelas que traziam a comitiva de Dom João VI de Lisboa com destino ao Rio de Janeiro aportou em Salvador no distante ano de 1808. Era a tal histórica fuga das tropas de Napoleão, que invadira Portugal. Durante a travessia do Atlântico que durou 55 dias, houve um surto de piolhos. Os carrapatinhos — provavelmente originários dos porcos, galinhas, cabras e vacas, embarcados para garantir alimentos — tomaram conta dos cabelos das senhoras da corte a bordo, inclusive de Dona Carlota Joaquina.
Ao desembarcarem na Bahia, as esposas e filhas dos fidalgos se valeram de toucas para não demonstrar o feio desenho dos penteados. As mulheres das autoridades que aguardavam a caravana no cais deduziram que os adereços faziam parte da última moda feminina na Europa. E durante anos usaram tecidos amarrados à cabeça.
O tempo passou e a moda pegou. Juscelino Kubitschek era um homem elegante, médico com formação na França e na Alemanha. Foi governador de Minas e, depois, presidente do Brasil. Desembarcou no Rio, com um diferente detalhe na maneira de vestir-se. JK usava no bolso superior do paletó, aquele que fica do lado esquerdo do peito, um lenço branco cuidadosamente dobrado. Passou a ser copiado por vários de seus correligionários.
Também o general João Figueiredo produziu costume copiado por muitos admiradores. Logo após assumir a Presidência, fez uma cirurgia nos olhos e, durante bom tempo, teve de usar óculos escuros para proteger-se da claridade. Optou pela marca Ray-Ban. Foi o suficiente para que várias amigos passassem a fazer o mesmo. Oficial de Cavalaria do Exército, o João sempre cavalgava e comparecia às competições e equitação. Não deu outra, para estar de acordo com o presidente. As escolas de montaria ficaram repletas de novos alunos. Figueiredo era fumante. Seu cigarro preferido era o Minister. Logo logo uma porção de frequentadores passou a fazer o mesmo. Até que um dia, após a operação do coração em Cleveland, nos Estados Unidos, Sua Excelência teve de parar com o hábito. No dia seguinte, ninguém mais que o cercava fumava.
Antes de Figueiredo, os generais Costa e Silva e Garrastazú Médici, gaúchos, mantiveram a tradição de tomar chimarrão quando mudam-se para a Capital. Claro que a maior onda passou a ser levar para os gabinetes daquela época cuias, bombas e garrafas térmicas com água quente para servir-se de erva-mate.
Com José Sarney presidente não foi diferente. Ele praticamente só usava ternos cujos paletós eram do estilo jaquetão. Escritor, membro da Academia Brasileira de Letras, Sarney sempre citava os sermões do Padre Vieira, de quem era leitor contumaz. Pronto.Virou moda ser conhecedor das obras do Padre Vieira. Era a nova onda para os homens da Nova República que queriam porque queriam andar tal e qual o novo ocupante do Palácio. Os alfaiates e as livrarias fizeram a maior festa. Jamais as lojas venderam tantos jaquetões quanto na Era Sarney.
Já com Fernando Collor no Planalto foi a vez de os homens do Poder copiarem alguns de seus hábitos. O uísque Logan passou a ser o drink predileto de muita gente. Assim como usar as canetas Mont Blanc. E as gravatas da grife francesa Hermés. Exemplo de adesão ao modelo presidencial foi o ministro do Trabalho Antonio Rogério Magri, que acrescentou em seu guarda-roupas uma série dessas gravatas. Aliás, Magri chamava a marca de Érmes.
Itamar Franco foi copiado também. Muita gente do seu entorno no Planalto nem quis saber se seu estilo era ou não bom padrão de elegância. Era comum ver em todo canto um sem número de executivos, políticos e empresários com o pisante idêntico ao do presidente. Passaram a usar, assim como Itamar, sapatos da cor azul-marinho. Isso mesmo, sapatos azul-marinho. E olha, virou moda mesmo. É só perguntar nas casas de calçados quantos pares venderam-se a mais naquele período.
Doutor Ulysses Guimarães, outro importante nome da história política do Brasil, de igual forma passou a ser imitado em seu gosto pelo Poire, raro aperitivo feito com caroço de pêra. No Piantella, restaurante de sua preferência em Brasília, até organizou-se o Clube do Poire, em homenagem a ele. Gente que nem consumia álcool passou a ser fã da bebida. Ao assumir a Presidência, Fernando Henrique passou a ser copiado em seus ternos de tom pastel. Tudo em nome de ficar atualizado com a moda do Poder.
Fidel Castro deu de presente a Lula, uma série das tradiconais camisas cubanas, as guayaberas. Foi o bastante para que grande parte de seus partidários passassem a usar também as tais blusas de mangas compridas com detalhes de renda. Dilma Rousseff, a primeira mulher a presidir o país, aderiu à moda dos terninhos, tipo Angela Markel, da Alemanha. Não tardou para que as ministras, deputadas e senadoras de seu partido também copiassem seu estilo de vestir.
Mas agora, com Jair Bolsonaro presidente é impressionante o grande número de gente que passou a usar, assim como ele, as canetas Bic.
Não custa destacar que em outros países a mania de copiar Suas Escelências é comum. Na Inglaterra, as ladies da corte não tiram os olhos dos chapéus da Rainha Elizabeth. Assim como em Washington, as celebridades copiam miss Ivana Trump. E os modistas, ficam atentos aos modelos das primeiras-damas.
Mas aqui no Brasil de Jair Bolsonaro, ministros, senadores, governadores, deputados, assessores, auxiliares, executivos, admiradores etc passaram ostentar as Bics, esferográficas baratinhas e, de certa forma, descartáveis. O ministro da Educação, Abraham Weintraub, por exemplo, quando foi para a sabatina na Câmara dos Deputados, levou logo três. Uma azul, outra preta e a terceira, vermelha. Evidentemente, como já disse, em muitos casos é mera coincidência.
Aagora, porém, com a crise que surgiu entre Jair Bolsonaro e Emmanuel Macron por conta das queimadas na Amazônia, o presidente brasileiro, magoado, passou a não usar mais as tais Bic, de origem francesa e produzidas em Manaus. Ou seja, em plena Amazonia. As trocou pelas similares e rivais Compactor, fabricadas em Nova Iguaçu, no Estado do Rio. Resta saber o que doravante farão aqueles que encheram seus bolsos com as Bics.