Por Maria Luiza Abbott e Marcelo Stoppa
Quando a narrativa virtual e a agenda real se encontram, o resultado é relevância e apoio nas redes. Foi esta conjugação que deu à pré-candidata do PC do B, Manuela D’Ávila, mais de 40% do total de relevância e visibilidade no ecossistema das eleições no Twitter. Sua narrativa em defesa das mulheres se encontrou com a revolta contra o vídeo em que brasileiros insultam uma mulher na Rússia, e Manuela voltou ao 1º lugar no ranking de relevância e visibilidade dos pré-candidatos a presidente na semana de 15 a 22 de junho, como indica a análise semanal da AJA Solutions.
Consistente no combate à desigualdade também de gêneros, Manuela foi rápida ao criticar o vídeo e a postar uma charge com sete homens das cavernas atacando uma mulher. Obteve ressonância entre os que se opõem à violência contra as mulheres e a comunidade LGBT, e conseguiu gerar diálogo com públicos que estão fora de sua órbita.
Com sua relevância estacionada pela quarta semana – 20% do total, metade do que conquistou Manuela -, o deputado Jair Bolsonaro (PSL) ficou em 2º lugar no ranking. Manteve o discurso usual, recheado de ataques à mídia, defesa da polícia e elogios a Donald Trump. As diferenças entre Bolsonaro e Manuela foram marcantes esta semana.
O vídeo com o assédio dos torcedores na Rússia foi ignorado por Bolsonaro e a análise da timeline dos dois mostra outras posições de clara divergência.
Numa série de tuítes, Manuela mostrou sua inconformidade e consternação com o caso e solidariedade com a mãe do menino Marcus Vinicius da Silva, baleado numa operação da Polícia Civil no Complexo da Maré, no Rio, no dia 20. Bolsonaro não tocou no assunto. No dia 22, ele tuitou: “Parabéns Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro”, com um vídeo mostrando policiais prendendo umas pessoas na rua. Teve alta repercussão entre seus apoiadores, com mais de 8.6 mil curtidas.
Para ele, a Copa do Mundo não é destaque. Ela veste a camisa do Brasil na foto do perfil, mantendo o discurso político: na camisa estão impressos “Lula livre” e o símbolo do PC do B. O tuíte de Manuela com a segunda maior ressonância na rede diz“canarinho & pistola & comunista”, com uma foto dela com o “canarinho pistola”. Esse tuíte teve mais visibilidade do que o pré-candidato do Novo, João Amoêdo, que ficou em 6º lugar no ranking.
Ela criou uma “torcida feminista”, em que, junto com um grupo de mulheres assistiu, e depois muitas comentaram, o jogo contra a Costa Rica. Bolsonaro, indicam as pesquisas, tem dificuldades em conquistar o voto feminino. Ela protesta com veemência contra a prisão de crianças, filhas de imigrantes nos Estados Unidos. Ele ignora o assunto e elogia Donald Trump por sair do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o que ela critica.
Em 3º lugar no ranking da semana, o ex-presidente Lula, que tinha ficado em primeiro na semana passada. Sem gerar fatos novos ou tuítes que capturem a imaginação e viralizem, o perfil perdeu visibilidade, mas ainda se manteve acima do patamar de relevância – piso de visibilidade para que os pré-candidatos consigam gerar diálogo em volume suficiente para que sua mensagem seja ouvida e tenha potencial para ser usada como instrumento de persuasão na busca de votos. Há indicações, porém, de que o perfil começa a enfrentar dificuldades em manter-se acima do patamar.
Em 4º, Guilherme Boulos, pré-candidato do PSOL e coordenador do MTST, que há quatro semanas está nesta posição. Esta semana, porém, Boulos ficou abaixo do patamar de relevância. Assim como outros candidatos, Boulos vem elegendo temas preferenciais. No caso dele, o meio ambiente e o combate à proposta de mudança da lei dos agrotóxicos no Congresso estão na sua lista, entre outros. Nenhum dos temas, porém, teve destaque na agenda nesta semana no Twitter e ele não aumentou engajamento com as notícias que moveram a rede.
Em 5º, o ex-governador de São Paulo e pré-candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, que teve o seu melhor desempenho em dez semanas. Foi ajudado pela combinação mídia tradicional com redes sociais, reproduzindo trechos de sua sabatina na rádio Jovem Pan, uma fórmula que já deu certo com outros pré-candidatos.
Por que analisar mídias sociais
A imprevisibilidade da eleição presidencial de 2018 e o impacto das redes sociais em outras votações no mundo fizeram surgir novas maneiras de mensurar o ânimo do eleitorado.
No método tradicional das pesquisas de opinião, geralmente pede-se que o entrevistado escolha o favorito dentre uma lista determinada ou faz-se uma pergunta aberta, sem oferecer nomes de candidatos. O método tradicional tendeu à imprecisão em 2014 quando apontava que o segundo turno da eleição presidencial seria entre Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (Rede), com Aécio Neves (PSDB) em um distante terceiro lugar. O cenário não se confirmou. Em 2010, as pesquisas tradicionais tinham acertado mais, ajudadas pelo ambiente político mais estável e uma comunicação mais concentrada.
Novas abordagens, como medir os sentimentos, auxiliam a interpretação da preferência do eleitorado – a aprovação e a rejeição de um candidato.
A disseminação do acesso à Internet transformou as redes sociais na escolha natural para o debate político. Entre 2010 e 2018, mídias sociais e protestos caminharam lado a lado durante a Primavera Árabe, Occupy Wall Street e Revolução Egípcia (2010), Indignados na Espanha (2011) e nos protestos de junho de 2013 no Brasil.
A sedimentação das redes sociais como campo de batalha de ideias ocorreu no referendo do Brexit, que aprovou a saída do Reino Unido da União Europeia (junho de 2016), e na campanha presidencial americana de 2016. Em ambos o casos, cenários mais complexos, em que há denúncias de uso de fábricas de fake news, trolls e de robôs para manipular a opinião pública online e influenciar o voto. Em ambos, de novo, as pesquisas tradicionais também tiveram dificuldades em prever os resultados.
Trump afirma que não teria sido eleito sem o Twitter. No Brasil, esta será a primeira eleição presidencial em que as redes sociais podem efetivamente influir no voto.
A análise semanal da AJA vem identificando os temas relevantes na campanha nas redes e quem está tratando deles (mapa de visibilidade e relevância), quais os limites das “bolhas de informação” (mapa de regiões de influência e afinidade), a adequação das estratégias de comunicação e sua eficacidade (índice de eficiência comunicacional e mensuração do ritmo de crescimento). Deste modo, avalia-se os diálogos online entre eleitores e candidatos, levando em conta a complexidade das interações não hierárquicas e das trocas simbólicas para explicar e apontar semanalmente os ganhadores dessa batalha virtual.
Não se tem parâmetros de comparação do impacto da comunicação nas redes com eleições anteriores. Nem se pode prever se, até outubro, os pré-candidatos terão conseguido fixar e ampliar sua capacidade de gerar diálogos para atrair o voto do público-eleitor. Semana a semana, vem crescendo o número de seguidores dos candidatos. As redes indicam que o número de seguidores não influi na capacidade de gerar diálogos e visibilidade. Não se sabe ainda a influência que terá em votos. A análise vai indicando tendências e os caminhos nesse mundo novo.
Foram analisadas esta semana 700 mil interações entre 342.893 usuários no ecossistema das eleições no Twitter. Os mapas de relevância e visibilidade e de influência e afinidade dos pré-candidatos revelam os erros, acertos e os caminhos que podem ser feitos para ganhar relevância na rede. A versão interativa dos mapas está disponível para assinantes.