Autocrítica

Foto Orlando Brito

Eu tenho uma amiga que hoje mora em Braga, a linda e agradável cidade do Minho, no Norte de Portugal. É uma goiana meio árabe, devoradora de pequi e dona de um humor simples, direto, rápido e inteligente. É encantada por poesia até perder o juízo. Longe do Brasil há um ano, trocamos quase sempre mensagens corriqueiras, sem importância, a maioria piadas. Algumas poucas vezes falamos de política. Pois bem, outro dia, a título de brincadeira, mandei uma música, junto com o clip, de um cantor que considero bem brega. Canção de letra pobre, com um teclado enjoado e três dançarinas, flores da simplicidade e do mau gosto. Tudo isso sob meu ponto de vista, o que quer dizer que pode ser o contrário.

Mas, retomando o rumo da prosa, ela me respondeu com as risadas características do Zap, não lembro se KKKK ou RSRS, e um comentário que me soou como alerta. Ela disse que o Brasil era muito mais parecido com aquela música do que com a Bossa Nova. Refleti e cheguei à conclusão que faço parte de um Brasil que não entende a maioria do país. Óbvio que a Bossa Nova é a cara que eu queria que representasse a nossa gente, mas não é. Assim como há muito mais coisas de um país mal compreendido e mal propagado.

Já foi o tempo em que acreditávamos ser o berço do sincretismo religioso, com respeito aos cultos de matriz africana. Papo furado, dormia na alma brasileira o gene do retrocesso pentecostal. Éramos o país do carnaval, onde tudo é permitido. Que nada, somos homofóbicos. Não somos generosos, matamos nossos mulheres, nossos jovens. Somos conservadores. E muitas vezes, cínicos, dissimulados e mentirosos.

No meio de tudo isso há um país dividido entre extremos reacionários e fanáticos. De um lado, o novo que nasce velho, carcomido, sujo. Do outro, uma rapaziada que faz de conta que nada tem a ver com isso.

Analistas, críticos, políticos pedem uma autocrítica ao PT, a Lula. Um reconhecimento de que o partido e seus dirigentes se lambuzaram no poder. Mas todos se negam a fazer essa autocrítica. E estão certos, certíssimos. Ora, se nada fiz de errado para quê autocrítica? Para dar munição aos adversários com um exercício de falso arrependimento? Não, fanáticos não fazem autocrítica porque têm certeza que trilham o caminho certo. E os dois lados seguem disputando o falso campeonato da virtude. São crentes.
E, a curto prazo, não há outra opção à vista. Mas uma saída há de surgir. Enquanto isso vamos testando a nossa democracia. Fora dela não há solução.

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