Na prática, o capital estrangeiro já entrou há tempos nas companhias aéreas em sociedade com os brasileiros, e a abertura de 100% ao capital externo para essas empresas pode até acabar sendo vantajosa para o consumidor/passageiro. O problema é fazer isso por medida provisória, numa canetada de Michel Temer a menos de vinte dias do final de seu mandato.
A pressa de Temer foi justificada por aliados do governo pela necessidade de encontrar uma solução rápida para evitar o fechamento da Avianca, em grave crise financeira. O futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, foi consultado, ouviu o presidente eleito, e concordou. Mas não dava para esperar vinte dias, ou buscar uma solução congressual?
É no mínimo imprudente que uma decisão dessa envergadura, que mexe num vespeiro como a abertura de um setor da economia ao capital estrangeiro, seja tomada assim, de afogadilho, depois de uma conversinha entre três ou quatro pessoas. Até porque essa discussão se arrasta há tempos, e há um projeto nesse sentido tramitando no Congresso, em torno do qual ainda não se obteve um acordo.
E se o Congresso não concordar? Não tem mais jeito, porque daqui a 90 ou 120 dias, quando a MP for votada, haverá um cenário de fato consumado. Todo mundo sabe que haverá uma confusão dos diabos, colocando em risco a imagem de seriedade internacional do Brasil (ou o que resta dela), se o Legislativo rejeitar a medida, fechando de volta o setor e expulsando os eventais investidores que tiverem sido atraídos pelo negócio nesse meio tempo.
Michel Temer até que está encerrando o mandato em situação mais razoável do que se pensava, dando entrevistas enaltecendo seu governo, tendo reconhecidas suas ações na economia e fazendo uma política de boa vizinhança com o governo que entra graças a uma transição civilizada.
Mas não tardarão a surgir as críticas e suspeitas sobre as razões do açodamento no caso das aéreas, ainda mais tratando-se de um presidente que é alvo de acusações no terreno da corrupção e que provavelmente terá que se ver com elas a partir de 1 de janeiro.
‘Presidentes em final de mandato deveriam ser parcialmente interditados, proibidos de tomar certas decisões, como medidas provisórias que podem mexer com bilhões.